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quarta-feira, 6 de junho de 2012

Adufg resiste à paralisação para não trazer desgaste ao governo do PT


Pelega?

Vinculada à CUT, associação insiste em uma negociação da qual o governo já abandonou a mesa.
Andréia Bahia
Nos oito anos dos governos Fernando Henrique Cardoso (1995–2002) os professores das universidades federais fizeram oito greves. Uma a cada ano. Durante os governos Lula da Silva (2003–2010), o Andes — hoje Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior e, na época, Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior — organizou apenas uma paralisação nacional, em 2005. Na época, o governo fez um acordo com a categoria, comprometendo-se a dar um aumento de salário em três etapas, de 2006 a 2010. A partir de 2010, os docentes começaram a discutir com o governo a necessidade de outro reajuste que viria recompor a perda salarial de 16,3% do período. Essa negociação não foi cumprida, o que levou a categoria a deflagrar a greve que teve início em 17 de maio.
A paralisação de 2005 provocou a cisão do movimento sindical dos docentes federais. Na era Lula, os professores ligados ao PT e ao governo petista passaram a ser contra o movimento grevista como forma de luta. Optaram por não fazer uma oposição frontal, considerando que o governo petista era, de qualquer forma, melhor que o tucano. Foram voto vencido dentro do Andes, que defendeu uma posição de autonomia em relação ao governo Lula. Os governistas decidiram, então, fundar o Sindicato dos Professores do Ensino Superior Público Federal (Proifes), uma entidade que nasceu no seio do próprio governo Lula. “O então ministro da Educação, Tarso Genro, catapultou o grupo à mesa de negociações com o governo antes mesmo de ele ser um sindicato”, lembra a presidente do Andes, Marina Barbosa, pro­fessora da Universidade Federal de Juiz de Fora.
A criação dessa segunda representação sindical da categoria é fruto da cooptação dos movimentos sindicais feita pelo governo Lula, avalia o professor Fernando Lacerda, da Universidade Federal de Goiás (UFG). O ponto alto dessa cooptação foi a indicação do presidente da CUT, Luiz Marinho, para titular do Ministério do Trabalho, em 2005. “Os sindicatos ligados à CUT se tornaram correia de transmissão do governo”, afirma o professor. A entidade deixou de agir com base no interesse dos servidores públicos federais, mas avaliando apenas o desgaste que as manifestações causariam ao governo petista.
Quem não concordava com essa atitude pelega da CUT se uniu em outras entidades. “Houve várias rupturas dentro dos movimentos sociais, na UNE, CUT, MST”, conta Lacerda. No caso dos professores das universidades federais, foram os governistas, que vinham perdendo eleições recorrentes, que saíram e criaram o Proifes. Segundo a presidente do Sindicato dos Docentes das Universidades Federais de Goiás (Adufg Sindicato), Rosana Maria Ribeiro Borges, o Proifes surge a partir de um grupo que “avaliou, na época, que a greve traz poucos ganhos e muitas perdas e só atinge a graduação.”
O professor Cláudio Maia, do Câmpus de Catalão, discorda. “Na história da categoria, grande parte das conquistas, inclusive a preservação a universidade pública, se deu pela greve.” Ele observa que há cinco anos as universidades federais não param. A Adufg é filiada ao Proifes, apesar de, oficialmente, continuar vinculada ao Andes. “Tem uma ligação orgânica com o PT e PCdoB”, afirma Lacerda. E leva esse vínculo umbilical à mesa que negocia o futuro da categoria.
Para o professor Maurício Alves da Silva, vice-presidente regional do Andes Planalto, cuja sede é em Goiânia, o grupo que criou a segunda entidade o fez somente porque perdeu a eleição interna. “E tudo indica que foi criado dentro do governo com uma proposta alinhada ao governo.” Não há dúvidas de que o Proifes tem ligação profunda com o PT e com o governo petista. Muitas dos professores que ocuparam cargos no governo Lula compõem a direção nacional do Proifes. “Um exemplo é o professor Gil Vicente, que ofereceu assessoria ao MEC para formular o novo plano de carreira”, conta Fernando Lacerda. Além disso, o Proifes é filiado à CUT, principal braço do governo no movimento sindical.
O último acordo assinado entre a categoria e o governo, em 2010, já não foi acatado pelo Andes, que é vinculado à CSP-Conlutas — Central Sindical e Popular. Mas a cisão não enfraqueceu o Andes. A greve nacional que a entidade convocou, em 17 de maio, teve a adesão imediata de 33 unidades e 47 das 63 universidades federais já aderiram à paralisação. Até a Uni­versidade Federal da Bahia, que é filiada ao Proifes, se uniu ao movimento grevista. Em nota, os professores baianos afirmaram que a direção do sindicato (Proifes) é “conciliadora e governista”.
A filiação da Adufg ao Proifes é criticada por professores da universidade goiana. “Em uma reunião es­vaziada, a direção decidiu sair do An­des e se filiar ao Proifes, que é atre­lado aos interesses do governo”, conta a professora do Faculdade de Educação da UFG Lucinéia Scremin Martins. Mas diferente da UFBA, a Adufg acompanhou a decisão do sindicato nacional — visto como “pelego” — e não aderiu à greve. A decisão provocou uma cisão no movimento sindical goiano. Os professores que são a favor da paralisação se uniram no Fórum de Mobilização dos Professores da UFG, “criado pelos professores descontentes com a representação sindical”, diz Lucinéia.
Na avaliação desses professores, a Adufg se nega a mobilizar a categoria e deixa os professores desinformados sobre o debate. Lucinéia conta que os informativos da entidade divulgam campanha da gripe ao invés de discutir a condição do professor. “A massificação e precarização do ensino superior, o Reune (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), e a equiparação do salário com o Ministério de Ciência e Tecnologia não são temas sobre os quais a Adufg nos informa”, diz a professora.
Na segunda-feira, 28, cerca de 50 professores do fórum se reuniram para discutir a situação da universidade em Goiás, onde duas unidades, as de Catalão e Jataí, aderiram à greve. A reunião foi uma preparação para a assembleia da Adufg, marcada para 6 de junho, na qual será votado um indicativo de greve. O fórum reclama que o acordo assinado em 2011, que previa um reajuste de 4% a partir de março de 2012, foi cumprido somente após o indicativo de greve, do dia 17 de maio, por meio de medida provisória editada pelo governo federal, uma vez que o projeto de reestruturação da carreira, que proporia aumento salarial efetivo e atendimento da data-base anual, não foi concluído dentro do prazo previsto.
O governo abriu negociação com os professores para discutir a reestruturação da carreira do docente federal em agosto de 2010. O prazo para apresentação de uma proposta final era março deste ano, mas nada foi apresentado. “O governo não quer negociar, está embromando, e a Adufg insiste em negociar com o governo”, critica Lucinéia Scremin Martins.
A categoria diz acumular uma perda de 16% de 2009 a julho de 2011, de acordo com os cálculos do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Com o aumento de 4% mais a incorporação das gratificações, o menor salário de um professor universitário federal, sem nenhum titulo de pós-graduação - doutorado, mestrado ou qualquer especialização - com uma jornada de 40 horas é de R$ 2.872,85. Um professor com dedicação exclusiva e título de doutorado recebe um mínimo superior a R$ 7 mil, segundo o MEC.  Para comparação, um promotor de Justiça e um juiz, em início de carreira, recebem R$ 19.643,95.
Os professores do fórum não querem discutir apenas o salário. Eles não aceitam a mu­dança no regime de recebimento de abono de insalubridade e periculosidade. Especificamente, o fórum rejeita seis propostas da minuta do projeto apresentada pelo Mi­nistério do Planejamento, Or­çamento e Gestão (MPOG): sobre o ingresso na carreira, todos passam a ingressar como auxiliar, independente da titulação, o que significa no mínimo 24 anos para alcançar o topo da carreira; quanto à progressão, será por meio de avaliação por de­sempenho regulamentada pelo MEC, desconsiderando a avaliação institucional e desrespeitando a autonomia universitária; em relação à aposentadoria, os professores já aposentados foram prejudicados, pois não há previsão de enquadramento na nova carreira; a remuneração passara a ser feita em duas linhas, vencimento básico e remuneração por titulação; manutenção da classe de titular separada do restante da estrutura da carreira, o que significa prejuízos na aposentadoria e manutenção de uma dupla carreira; e a criação da remuneração por projetos de pesquisa, extensão e especialização administrados por órgãos das reitorias, o que fere autonomia docente no desenvolvimento de projetos.
Na opinião os professores do fórum, segundo uma carta endereçada aos docentes, a abertura de negociação “tem se revelado como uma estratégia de protelar a questão, desmobilizar os professores e definir de cima a baixo uma proposta de carreira que sela a precarização do trabalho docente por meio de mecanismos mercantis e gerencialistas de organização das atividades acadêmicas, da estrutura da carreira e da malha salarial dos professores das IFES”.
A presidente da Adufg, Rosana Maria Ribeiro Borges, concorda que as medidas propostas pelo governo prejudicam os professores, mas considera que seria precipitado entrar em greve antes de concluída a mesa de negociação, que segundo ela, atrasou devido à morte do secretário de Recursos Humanos do MPOG, Duvanier Paiva Ferreira, em janeiro deste ano. As entidades que faziam parte da mesa de negociação, Andes, Proifes e Sinasefe, concordaram em prorrogar a data de 30 de março para 31 de maio. Mas até mesmo a Adfug foi surpreendida com a mudança na forma de pagamento da insalubridade e periculosidade, feita pelo governo por meio de medida provisória na primeira semana de maio.
Com a mudança, o pagamento do adicional que era feito com base nos porcentuais de 5%, 10% e 20% do salário básico do professor, passou a ser pago em valores fixos de R$ 100, R$ 180 e R$ 260. “Isso significa redução salarial e não foi discutido com a categoria”, afirma a presidente da Adfug. Ela critica também as perdas que o professor terá com a reforma da Previdência. Os que se aposentaram 2004 já deixaram de receber salário integral e os que se aposentarem a partir de 2012 vão receber o teto da previdência geral da iniciativa privada, R$ 3.916,20. “Para piorar a situação, com a greve, o governo cancelou a ultima reunião da mesa de negociação, marcada para 28 de maio, e suspendeu as negociações”, conta Rosana. Segundo ela, o Proifes vai discutir a possibilidade de deflagrar greve agora em junho e há também um indicativo de greve dos servidores públicos federais.
Em carta aos professores, de 29 de maio, a Adufg esclarece que, na assembleia de 16 de maio, os professores aprovaram a convocação de uma nova plenária para o dia 6 de junho, para apreciar um indicativo de greve a partir do dia 11. Diante do cancelamento da reunião do grupo de trabalho que trata da reestruturação da carreira do docente, que ocorreria no dia 28, a Adufg concluiu que “no pano de fundo do cancelamento está a posição do governo de não negociar com categorias em greve. Um duro golpe nas entidades que compunham a mesa de negociação e na democracia, já que o movimento de greve é, constitucionalmente, legítimo e legal”. Segundo a carta, se o cenário não mudasse, “indicaria um rompimento do GT por parte do governo”.
É provável, portanto, que a Adufg abandone a orientação do sindicato governista e entre em greve a partir de 11 de junho. A  paralisação deve ser longa. Os professores estão se preparando para uma greve de no mínimo quatro meses.

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