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terça-feira, 22 de maio de 2012

O que o escândalo Cachoeira fala dos donos do poder no Brasil


Foto: ft-ci.org

Por Leandro Ventura
O mais novo escândalo a irromper em terras tupiniquins parece ser de uma envergadura inaudita. Alguns jornalistas chamaram a CPI de “CPI do fim do mundo”, hoje começa a surgir a preocupação oposta, seria esta a CPI que vai acabar na “maior pizza do mundo”? Com tantos tentáculos e tanto riscos cruzados (se eu te denunciar pode ser que você me denuncie) é mais provável que evolua para a segunda opção, com alguns bodes expiatórios, mesmo que estes sejam contados em dezenas. O sistema precisa se preservar, mudar para continuar o mesmo. Este escândalo escancara como são não só os políticos burgueses e seus partidos, mas também a classe dominante nacional. Não faltam interessados na condução “responsável” dessa CPI.
É preciso ver o que e quem ela envolve para chegar ao que está sendo exposto com a mesma. Que traços estruturais do capitalismo e seu Estado no Brasil este escândalo, como a ponta de um iceberg, revela.

Quem e o que está envolvido neste escândalo?
Este escândalo envolve todos os principais partidos burgueses (PMDB, PSDB, PT e DEM), governos estaduais distantes e opostos (GO, DF, RJ, TO, mas praticamente não há governo sem relação com a Delta, inclusive os tucanatos paulistas e mineiros). Envolve paladinos da ética como Demóstenes Torres (ex - DEM), envolve festas em Mônaco e Paris de Cabral e Cavendish da Delta – que por sua vez tem relações de casamento e compadrio com Aécio Neves (PSDB-MG) –, enlameia as construtoras e suas relações com os partidos políticos, coloca em questão a justiça burguesa com as múltiplas relações de Cachoeira com a justiça goiana e mesmo com Gilmar Mendes do STF. Joga dúvidas em tudo que se sabe sobre o Mensalão, pois parte do que conhecemos, sabemos a partir do Procurador Geral da República Roberto Gurgel que ficou sentado anos em cima destas denúncias de Cachoeira, e também através do que Demóstenes plantou na Veja a partir de suas relações com a ABIN e Cachoeira. Este mesmo escândalo questiona o que é verdade, o que é plantado, ou mesmo o que é obtido de forma ilegal (sendo verdade ou não) pela maior revista do país, a VEJA, e por extensão leva a questionar o conjunto deste latifúndio controlado por um punhado de famílias – diversas com eminentes políticos como os Sarney, Collor de Mello, etc., que é a mídia no Brasil.
Este escândalo faz questionar o lado petista da mesma justiça (não só o Gilmar Mendes), mas também o Ministro da Justiça de Lula, Thomaz Bastos que é advogado de defesa de Cachoeira. Faz gerar dúvidas imensas sobre quem é dono do que. Seria Cavendish um laranja de Cachoeira? Seria parte desta operação de destruição da Delta algo que Odebrecht, Camargo Correa e afins querem, como já ocorrera anteriormente com outra construtora e políticos sendo implodidos como no escândalo Gautama - Ministério da Energia? Como um tal de Cachoeira (seria ele por sua vez laranja de alguém?), a partir do jogo do bicho, claro que algo rentável, pode ter tentáculos tão intermináveis e ilimitados, e para que? Tudo isto só para legalizar o jogo do bicho e os bingos?

Contra o esquartejamento interessado do escândalo e a passividade construída em como encará-lo

Raymundo Faoro terminou seu clássico livro “Os donos do poder” onde disserta sobre as elites brasileiras, seu patrimonialismo e a formação do que ele argumenta ser um “estamento burocrático” governante, com uma frase que marca como os trabalhadores brasileiros encararam no último período os repetidos escândalos de corrupção: “sempre foi assim”. Em Faoro, as transformações econômicas, sociais e políticas estão sempre processadas e contidas pela “túnica rígida do passado inexaurível, pesado, sufocante”. Sempre houve corrupção e o peso deste passado se reprocessando, atualizando e mudando é visível e como argumentaremos mostra não só o que é o regime burguês no Brasil, mas sua própria classe dominante. Desta continuidade não devemos concluir que sempre terá que ser assim e menos ainda, como quer a ideologia burguesa, que a aceitação passiva da mesma seria um “traço típico do brasileiro”. É só recorrer à história recente, com todos seus limites, para encontrar os caras-pintadas e o Fora Collor a desmentir a “passividade brasileira”.
Esta passividade é uma construção tanto das condições objetivas de crescimento econômico, emprego, renda, e crédito para impulsionar um consumo expandido para além das capacidades salariais. E, mais importante, por condições subjetivas construídas pelas classes sociais e seus atuais setores dirigentes.
Em primeiro lugar, Dilma com sua popularidade recorde, consegue mostrar-se como algo diferente e oposto a seus ministros e parceiros de partido e governo envolvidos em escândalos; a burocracia sindical (CUT, Força Sindical, CTB, etc) e estudantil (UNE) blinda a presidente e todos os ministros que lhe interessa blindar. A oposição burguesa faz denúncias até o ponto que lhe interessa ou é necessário fazer. O PMDB não fala nada e ninguém espera que o centro do pragmatismo político e dos negócios coligados a este pragmatismo fale algo.
A mídia, em sua batalha por informação e óbvio – venda de exemplares e anúncios –, mostra facetas opostas (e mutiladas) do escândalo conforme seus interesses. Para a Veja, afim ao DEM e PSDB, trata-se do PT e o PMDB querendo impedir que a CPMI efetivamente puna alguém dos seus e que no máximo (para o PT) também sirva para enlamear o Procurador Geral da República e o julgamento do Mensalão. E nisto, a Veja também não quer publicar uma só linha de como Cachoeira falava nas gravações como se fosse o editor-chefe da revista de maior circulação do pais. A maior parte da mídia no Brasil sequer menciona o “lado Veja” do escândalo, há que supor por motivos gerais (também tem relações similares e interesses de frações de classe similares), mas também não deveríamos nos surpreender por motivos também particulares, quem mais será que está na conta de Cachoeira, ou mesmo na conta de alguém maior que o bicheiro e que o bicheiro seria só um operador.
Para a antípoda da Veja, a Carta Capital [1], afim ao PT, trata-se de um escândalo centrado na relação de Cachoeira-Demostenes com a Veja. Muito menos barulho sobre as empreiteiras ou Sérgio Cabral (não que não mencione, mas muito menos que o “lado Veja” do escândalo). Regionalmente também se constroem versões mutiladas do escândalo, no Rio de Janeiro, o barulho envolvendo a Delta é maior, pois se trata de acertar o prefeito Eduardo Paes através de acertar seu padrinho político o governador Sérgio Cabral (ambos do PMDB e com interminável leque de alianças).
Os autointitulados “blogueiros progressistas” (melhor seria dizer filo-governistas) dão maior ênfase ao lado tucano e ao lado Veja desta rede. Há de se esperar que falem menos do lado petista da rede, mas focar-se só na mídia impressa e omitir que são os maiores latifúndios da mídia que são as redes de televisão e rádio (e sua ligação com as Igrejas – agora há quem queira louvar a Record por denunciar a Veja, e pule sua ligação com a Igreja Universal) é também mutilar o “problema do PIG” (partido da imprensa golpista como eles chamam). Parte deste PIG é da base aliada, são os Sarney e Collor com suas retransmissoras da Rede Globo e monopólio de informações em seus estados.
Em meio a tanto fogo cruzado, tanta notícia pela metade ou em frações ainda menores, cada uma condizente com objetivos eleitorais-mercantis de cada fração política (e talvez empresarial) em jogo. Para o DEM e PSDB trata-se de sobreviver, acertar alguns petistas e não ter seus objetivos eleitorais implodidos. Para o PT trata-se de acertar a oposição de jeito e/ou livrar seus quadros históricos no julgamento do mensalão. No Rio trata-se de acertar Cabral, mas encobrir as relações de César Maia e Garotinho com o mesmo Cavendish. Para a Veja e a Carta Capital vender-se como paladinas da ética, da verdade e de assinaturas. Em meio a isto e sem nenhuma direção seja de sindicato, seja de diretório central de estudantes, chamando à rua para trazer abaixo este traço estrutural do capitalismo e dos governos no Brasil, a corrupção, o mais provável é que os trabalhadores processem passivamente mais um escândalo. Ainda assim não deixam de processar e com este artigo queremos ajudar a processar o que o escândalo Cachoeira-Delta-Governadores-Partidos-Justiça-mídia, mostra da elite brasileira em seu aspecto histórico e também contemporâneo.
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