Mundurukus afirmam que nota da Secretaria Geral da Presidência desqualifica lideranças, é difamatória e aprofunda preconceito no Brasil. Ministério não comenta
Verena Glass,
Repórter Brasil
08/06/2013
Lideranças e caciques indígenas
da etnia munduruku, residentes em áreas afetadas e ameaçadas pela construção de
hidrelétricas nos rios Tapajós (PA) e Teles Pires (MT), protocolaram uma
interpelação criminal contra o ministro da Secretaria Geral da Presidência da
República (SGPR), Gilberto Carvalho, alegando crime de calúnia e difamação. A
Repórter Brasil tentou ouvir a SGPR sobre a representação, mas não obteve
retorno até o fechamento.
Os indígenas reclamam de nota
divulgada à imprensa em 6 de maio, na qual a Secretaria Geral afirma que as
“pretensas lideranças Munduruku têm feito propostas contraditórias e se
conduzido sem a honestidade necessária a qualquer negociação”, e que “alguns
Munduruku não querem nenhum empreendimento em sua região porque estão
envolvidos com o garimpo ilegal de ouro no Tapajós e afluentes. Um dos
principais porta-vozes dos invasores em Belo Monte é proprietário de seis
balsas de garimpo ilegal”.
Veldenir Munduruku, uma das
lideranças do grupo indígena, afirma que as acusações não têm fundamento.
“Naquela nota Gilberto Carvalho desconsidera os caciques e nossas lideranças,
denigre a nossa imagem e faz acusações mentirosas. Ele fala que uma de nossas
lideranças é dono de balsas de garimpo ilegal, o que é mentira. Com isso ele
tenta nos deslegitimar, dividir o povo indígena, dizer que não temos palavra.
Isso vindo de um ministro é muito grave”.
A Interpelação Judicial
Criminal, protocolada no Supremo Tribunal de Justiça (STJ), é, de acordo com o
documento, uma “medida preparatória de posterior Ação Penal em face do Sr.
Ministro da Secretaria Geral da Presidência da República Gilberto Carvalho em
virtude de declarações difamatórios, caluniosas e injuriosas feitas contra o
Povo Indígena Munduruku”. O documento demanda que o ministro “1. apresente, no
prazo estipulado por lei, o nome de lideranças indígenas as quais se dirigem
suas ofensas contidas na Carta de Esclarecimento postada no site da Secretaria
Geral da Presidência, para que estas tenham a oportunidade de processá-lo
criminal e civilmente. 2. Que informe se a Presidente da República Dilma
Roussef avalizou a infeliz carta ou informe se o conteúdo da mesma é de sua
exclusiva responsabilidade. 3. Que nomine quais são os seus assessores
diretamente envolvidos na elaboração e veiculação da carta.” (clique aqui para
ler a íntegra da interpelação)
Segundo Sergio Martins, um dos
advogados do processo, o ministro da Corte Especial do STJ, Napoleão Nunes Maia
Filho, que recebeu a ação, deve notificar Carvalho para que se explique sobre
as acusações. Até o começo da tarde de sexta-feira (7), isso não havia
acontecido. Posteriormente, os indígenas estudam entrar com queixa-crime contra
o ministro da SGPR. “Consideramos que a nota da SGPR causou um grave prejuízo à
imagem dos indígenas por seu caráter difamatório. Observações assim, ainda por
cima vindos de um ministério do governo, aprofundam ainda mais o preconceito
contra os indígenas e suas lutas por diretos”, afirma Martins.
Dialogo tenso
Os munduruku representam a
maior parte do grupo de indígenas que ocupou, por duas vezes em maio, o
principal canteiro de Belo Monte, para demandar a realização das consultas
indígenas (previstas na Constituição Federal e na Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho) nos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires.
No início de junho, a SGPR
propôs a realização de novas rodadas de conversa em Brasília para que Belo
Monte fosse desocupada. No dia 3, em reunião com os manifestantes Carvalho
descartou qualquer negociação referente à Belo Monte, mas propôs abertura de
diálogo aos indígenas do Tapajós.
Insatisfeitos com o resultado,
o grupo resolveu permanecer na capital e demandou do governo um posicionamento
sobre o caráter das consultas – se serão ou não vinculantes, ou seja, se a
decisão dos indígenas sobre a construção ou não de usinas será respeitada. Na
quinta, 6, o governo publicou outra nota no site da SGPR, reafirmando a
obrigatoriedade das consultas por parte do governo, mas não definindo detalhes
de seu poder ou não de veto.
“Ainda não recebemos essa
resposta”, afirmou Valdenir nessa sexta, 7. "Ontem funcionários do governo
tentaram entregar um documento enquanto estávamos fazendo uma manifestação, mas
queremos que a resposta seja oficial, dada a todo nosso povo em reunião com o
ministro”,explica o líder indígena.
Foto: Ruy Sposati/Cimi
Fonte: Brasil de Fato
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