Fernando Rodrigues
21/06/2013
21:40
O pronunciamento da presidente
Dilma Rousseff nesta noite de sexta-feira (21.jun.2013) não trouxe nenhuma
novidade a respeito do posicionamento do governo federal sobre as manifestações
de rua. O mais notável foi seu tom de ameaça em vários trechos quando falou que
o governo não vai “transigir” com atos de violência.
Mas o que fez o governo até
agora? Há quase duas semanas que as principais cidades do país têm ficado
paralisadas no final da tarde.
Como o Brasil é um país
conservador, talvez o pronunciamento da presidente possa ter algum efeito
tranquilizador em parte da população. Foi uma gravação realizada da forma mais
conservadora possível. Em frente a um fundo de madeira, ela usando um blaser de
tom amarelo acabou lendo no teleprompter por 9 minutos e 43 segundos. É uma
fala muito longa sob qualquer métrica possível. Mas Dilma não tinha saída.
Como a presidente raramente dá
entrevistas formais para mídia (exceto para falar de novelas ou “faits
divers”), quando fala é necessário ficar descrevendo uma lista sem fim do que
considera útil dizer para a população –mesmo que o governo já gaste mais de R$
1 bilhão por ano em propaganda.
Em certa medida, o
pronunciamento de Dilma tenta recuperar o tempo perdido por ela nos últimos
dois anos e meio. Sobretudo quando chegou a dizer que vai se esforçar agora
para incentivar uma “ampla reforma política”. Essa expressão “reforma política”
chega a provocar ataques de narcolepsia em quem acompanha o mundo do poder aqui
em Brasília. Basta haver um problema de qualquer ordem no país que o presidente
de turno fala sobre a necessidade de uma… reforma política. Passa a crise ou
arrefecem os seus efeitos, a reforma política nunca sai.
Por que Dilma nunca falou sobre
a necessidade de uma reforma política antes? Foi pega de surpresa agora?
Em outro trecho do
pronunciamento, a presidente faz uma confusão com algo que ela própria
patrocinou. Diz que a Lei de Acesso à Informação “deve ser ampliada para todos
os poderes da República e instâncias federativas”. Como assim, ampliada? A lei
já vale para todos os Poderes e para governos estaduais, prefeituras e União.
Talvez até de maneira
inadvertida, Dilma acabou passando um pito em cadeia nacional de TV em
prefeitos e governadores –que, de fato, cumprem de maneira precária a Lei de
Acesso. E o que dizer da própria presidente, que acaba de decretar sigilo sobre
todas as informações de gastos de suas viagens ao exterior? Como ela própria
disse “a melhor forma de combater a corrupção é com transparência e rigor”.
Pois é.
Em resumo, quem redigiu e
copidescou o pronunciamento não estava muito familiarizado com o governo de
Dilma Rousseff. E a própria presidente não fez a revisão necessária daquilo que
leu no teleprompter. É desagradável quando ocorrem tantos descuidos em um texto
para o qual a petista e sua equipe de marketing tiveram dois dias para produzir.
Sobre a Copa do Mundo e seus
gastos, Dilma usou outra verdade pela metade para tentar conter a irritação dos
indignados que foram à rua protestar. A presidente afirmou que todos os gastos
para construir estádios e outras obras são empréstimos que serão pagos pelas
empresas e Estados que receberam esse dinheiro. Não é bem assim. Tem muito
dinheiro público, do BNDES, com juros que são subsidiados por todos os
brasileiros.
Mesmo que as empresas e Estados
paguem esses empréstimos (se é que vão pagar), terão recebido um grande
benefício por causa dos juros camaradas. E mais: a maioria dos recursos foi
para governos estaduais. Ou seja, se esses governos pagarem, ainda assim terá
sido usado dinheiro público –portanto a presidente tergiversou ao dizer que não
usaria fundos estatais. Já usou.
A suntuosidade das obras da
Copa é um dos poucos pontos de consenso na irritação de quem têm ido às ruas
protestar. Há uma sensação forte de que tudo foi feito apenas para turistas e a
elite usarem.
Dilma também anunciou que
convidará governadores e prefeitos de grandes cidades para aperfeiçoar as
instituições e anunciar novos planos de ação.
Por exemplo, o Plano Nacional
de Mobilidade Urbana. Agora? A menos de um ano da Copa do Mundo?
E os prefeitos e governadores em
Brasília? Esse tipo de reunião é tão improdutiva como a do ministério de Dilma
– que com 39 integrantes precisaria de mais de um dia de reunião se todos
falassem por meia hora.
Tudo considerado, não dá para
dizer que Dilma cometeu o mesmo erro de Fernando Collor (que em 1992 pediu aos
brasileiros que se vestissem de verde e amarelo e todos usaram preto). Ainda
assim, o resultado parece ter ficado longe do que a presidente precisaria para
tentar recuperar a autoridade perdida nos últimos dias.
Eis a transcrição do pronunciamento
lido por Dilma na TV
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