Presente à entrevista de ontem, ministro Aldo Rebelo não desmentiu informação sobre "tribunais da FIFA" |
Anúncio, vago, foi feito por assessor do ministério da Justiça. Na África do Sul, medida produziu penas desproporcionais e atingiu direitos básicos da cidadania
Por Antonio Martins
Publicado em 5 de dezembro de 2013
Presentes à entrevista coletiva
que autoridades brasileiras concederam ontem na Costa do Sauípe, às vésperas do
sorteio de chaves para a Copa do Mundo, os jornais e TVs brasileiros (1 2 3)
deixaram passar em branco uma informação de enorme gravidade. Em determinado
momento, André Rodrigues, consultor especial do ministério da Justiça para
grandes eventos, anunciou que o governo
pretende criar “tribunais especiais” para julgar e punir, em rito
sumário, supostos delitos relacionados ao torneio. O ministro Aldo Rebelo,
principal entrevistado, não desmentiu a informação, destacada pelo Guardian e
Telegraph, da Inglaterra.
Tribunais de exceção, como os
mencionados por André Rodrigues, não são uma novidade absoluta. Seu retrospecto
são sentenças desproporcionais, para preservar privilégios dos grandes
patrocinadores dos jogos. Foram instituídos pela primeira vez na Copa de 2010,
na África do Sul. Na época, 56 “cortes especiais da FIFA” foram criadas em todo
o país. Funcionavam 15 horas por dia. Mobilizaram 1,500 juízes, promotores e
funcionários — desviados de suas atividades num Judiciário que, como o
brasileiro, é sobrecarregado e lento. O pior, porém, foi o tipo de “justiça”
sumária que aplicaram, atropelando direitos e liberdades em nome da segurança
do evento e dos interesses econômicos.
Uma reportagem do New YorkTimes publicada à época descreve cenas registradas num destes tribunais, em
Johannesburgo. Um jovem de 22 anos foi condenado a 5 anos de cadeia pelo roubo
simples de um celular, que não envolveu nem violência, nem ameça contra a
vítima. Ao proferir a sentença, o juiz revelou a mentalidade submissa que o
movia: “Você sabia que o homem de quem roubou não era daqui”. E ainda ameaçou:
“Se você não fosse primário, o tribunal não hesitaria em condená-lo a dez ou
quinze anos de cadeia”.
Mas as “cortes
especiais da FIFA” não se preocupam apenas com a segurança pessoal dos
turistas: estão encarregadas de enquadrar ameças ao monopólio de imagem que os
patrocinadores do torneio querem impor nos estádios.Passaram pelo tribunal
cidadãos do Brasil, Peru, Índia, Alemanha e Estados Unidos. Duas jovens
holandesas, por exemplo, foram levadas diante dos juízes por… vestirem
camisetas da cor laranja (veja foto). A atitude foi considerada propaganda
ilegal em favor da cervejaria Bavaria — concorrente de uma patrocinadora
oficial da FIFA. As moças, contou o Guardian, correriam o risco de condenação a
até seis meses de cadeia, a despeito dos protestos da embaixada holandesa…
Na entrevista de ontem, o
ministro Aldo Rebelo lembrou que os crimes comuns são uma preocupação das
autoridades brasileiras durante a Copa, mas não constituem exclusividade
brasileira. “A única vez em que fui assaltado, estava em Paris”, disse ele.
Além dele, e de André Rodrigues, também falou aos jornalistas Andre Pruis, um
ex-vice-chefe de polícia da África do Sul agora contratado pela FIFA como
consultor de segurança para a Copa-2014. Segundo ele, o uso de balas de
borracha, pela polícia, é um “nível baixo de ação”. “Machucam, mas o que a
polícia vai usar? Pistolinhas de brinquedo? Canhões de água? Isso não funciona,
a partir de um certo ponto”.
Fonte: Outras
Palavras
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