Nos últimos meses, cinco Tupinambá e um Pataxó foram assassinados; na foto acima, caminhão escolar com marcas de bala depois de emboscada praticada por pistoleiros
11/11/2013
do Cimi
Três assassinatos e invasões à
área indígena coordenadas por fazendeiros, ocorridos neste final de semana na
Terra Indígena Tupinambá de Olivença, sul da Bahia, contradizem os efeitos da
‘mesa de diálogo’ imposta pelo Ministério da Justiça para resolver o conflito
fundiário na região, em detrimento da publicação da Portaria Declaratória. Nos
últimos meses, cinco Tupinambá e um Pataxó foram assassinados no contexto da
luta pela terra tradicional no extremo sul baiano. Na foto ao lado, caminhão
escolar Tupinambá com marcas de bala depois de emboscada praticada por
pistoleiros em agosto.
Os últimos mortos deste
conflito foram Aurino Santos Calazans, 28 anos, Agenor de Souza Júnior, 28
anos, e Ademilson Vieira dos Santos, 36 anos. Conforme lideranças Tupinambá, os
três indígenas regressavam da comunidade Cajueiro, por volta das 18 horas dessa
sexta-feira (8), lado sul do território tradicional, quando foram emboscados
por quatro homens em duas motos. Disparos de arma de fogo foram feitos contra
os indígenas e na sequência os assassinos praticaram violências contra os
corpos.
Boatos davam conta de que na
tarde de sábado (9), dois dos executores do crime teriam sido presos, mas a
polícia não confirma. “Um deles é Tupinambá, mas os outros três são ‘brancos’.
Esse índio a gente já sabia que estava envolvido com os fazendeiros e nem
morava na aldeia. Já os outros andavam por aqui armados, ameaçando”, explica o
cacique Valdelino Oliveira dos Santos. Para a liderança, trata-se de uma
“tragédia anunciada” para as autoridades.
“A gente já pediu para a
Polícia Federal revistar os não-indígenas que transitam dentro da terra
indígena, nas regiões de retomadas, mas eles só fazem revistar os índios,
entrar nas aldeias para levar facões, bordunas, pilão como parte de operação de
desarmamento. Enquanto eles nos deixam vulneráveis, os pistoleiros agem cada
vez mais”, denuncia cacique Val Tupinambá, como é mais conhecido. Ele afirma
que os indígenas mortos não eram lideranças, mas moravam em região de retomada
e cercada por fazendas.
Aurino, Agenor e Ademilson
foram enterrados na tarde deste domingo (10), no cemitério do Bairro Nelson
Costa, em Ilhéus (BA). Os Tupinambá, durante o ritual fúnebre, realizaram um
protesto contra a violência a que estão submetidos na luta pela terra
tradicional.
“Porque tem um índio envolvido,
mas cooptado pelos fazendeiros, e os outros são pistoleiros que a gente sabe de
onde vem. Temos documentos apontando as ameaças. Tudo isso estava previsto.
Vamos encaminhar a apuração dos fatos para a Polícia Federal”, diz cacique Val.
Serra
do Padeiro e Serra das Trempes
A emboscada ocorreu numa região
da Terra Indígena Tupinambá de Olivença, que fica entre a orla da praia e as
Serras que compõem o território indígena. Horas antes dos assassinatos, ainda
na sexta, 8, grupos de não-indígenas, coordenados por fazendeiros, subiram as
serras do Padeiro e das Trempes para fazer a colheita do cacau.
Na Serra das Trempes, aldeia
Santana, os homens enviados pelos fazendeiros conseguiram retirar o cacau
colhido pelos indígenas. Ao fim do serviço, deixaram uma placa: Retomada dos Fazendeiros.
Na Serra do Padeiro, porém, a comunidade não permitiu que indivíduos enviados
pelos fazendeiros saíssem da terra indígena com o material apreendido.
Lideranças Tupinambá da Serra
do padeiro não confirmam, todavia, a informação veiculada pela imprensa de
Ilhéus e Itabuna dando conta da retenção de 16 ‘trabalhadores’ pelos indígenas.
Conforme as lideranças, que aqui não identificamos por motivos de segurança, os
‘brancos‘, com um caminhão, teriam invadido área retomada, a mando de
fazendeiros, para a retirada de cacau e apenas foram convidados a sair da terra
indígena.
Para o coordenador do Conselho
Indigenista Missionário (Cimi) Regional Leste, Antonio Eduardo Cerqueira de
Oliveira, “a região é historicamente dominada pela elite local ainda atrelada
às práticas coronelistas. Existe muito racismo e preconceito. Esperamos
providências do governo federal para a regularização imediata destas terras
indígenas para que mais indígenas não sofram com tais violências. Exigimos também a apuração destes crimes”.
Oliveira é enfático ao afirmar
que o governo federal, sobretudo o Ministério da Justiça e a Presidência da
República, devem rever a postura de suspender demarcações para apostar em mesas
de diálogo: “Está claro que esta saída não é boa para os indígenas, sobretudo,
mas também para os pequenos agricultores e o próprio governo, que espera
atender interesses pré-eleitorais ao não demarcar”.
Portaria
Declaratória
O processo de identificação da
Terra Indígena Tupinambá de Olivença teve início em 2004. Em 2009, a Fundação
Nacional do Índio (Funai) aprovou o relatório circunstanciado que delimitou a
terra em 47.200 mil hectares, estendendo-se por porções dos municípios de
Buerarema, Ilhéus e Una, no sul da Bahia. No momento, aguarda-se a assinatura,
pelo ministro da Justiça, da Portaria Declaratória, para que o processo se
encaminhe para as etapas finais.
No segundo semestre deste ano,
o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, decidiu não assinar portarias
declaratórias com a desculpa de querer evitar conflitos entre indígenas,
pequenos agricultores e fazendeiros. No lugar, montaria ‘mesas de diálogo’ para
negociar as demarcações. Aos Tupinambá, inclusive, chegou a dizer que os
indígenas teriam de abrir mão de áreas da terra tradicional e parar as
retomadas para que a demarcação saísse em 2014.
Fonte: Brasil de
Fato
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