Reinaldo Gonçalves[i]
Há queda da desigualdade da
renda no Brasil e no restante da América Latina na primeira metade do século
XXI. Sem mudanças estruturais, a redução da desigualdade da renda no Brasil e
na maior parte dos países da América Latina parece resultar de políticas
públicas, seja gasto social, seja política salarial (mínimo). O imperativo da governabilidade
e a perpetuação no poder são os determinantes principais destas políticas,
independente do modelo econômico-político vigente em cada país. Ou seja, as
políticas de redistribuição da renda são funcionais na luta pelo poder
político. Estas políticas, por seu turno, só foram possíveis graças à evolução
favorável da economia mundial, via afrouxamento da restrição das contas externas
e das contas públicas, no período 2003-08. Sem mudanças estruturais, o Brasil é
mais um exemplo deste fenômeno. O país experimenta melhora marginal na sua
posição no ranking mundial dos países com maior grau de desigualdade – entre
meados da última década do século XX e meados da primeira década do século XXI
o Brasil sai da 4ª posição para a 5ª posição no rank mundial dos países mais
desiguais.
Há tendência de redução da
desigualdade da renda no Brasil e no restante da América Latina na primeira
década do século XXI (CEPAL, 2010, p. 51-54). Este fenômeno é particularmente
relevante quando se leva em conta que a América Latina, em geral, e o Brasil,
em particular, têm índices
relativamente elevados de desigualdade pelos padrões internacionais[ii].
Este artigo foca na análise da evolução da
desigualdade da renda no Brasil e no restante da América Latina na primeira
década do século XXI[iii].
Na seção 1 discute-se a
evidência empírica para o conjunto dos 12 países da América Latina (inclusive,
Brasil) que formam o painel. A evidência disponível informa a redução da desigualdade
da renda no Brasil e no restante da América Latina na primeira década do século
XXI. Estudos recentes mostram
que este fenômeno decorre, principalmente, da elevação dos gastos públicos
sociais (e.g, via transferência de renda para os pobres) e da redução do diferencial
entre os rendimentos dos trabalhadores qualificados e os de baixa qualificação (que
recebem salário mínimo ou salários referenciados ao mínimo) (López-Calva e
Lustig, eds.,
2010). Entretanto, estes estudos falham ao não perceberem os determinantes
principais e o condicionante básico da expansão dos gastos públicos sociais e
do aumento do salário mínimo real.
Na seção 2 analisa-se a
evolução da desigualdade da renda no Brasil e no restante dos países da América
Latina comparativamente ao resto do mundo. Na seção 3, além da síntese dos
principais resultados, apresentam-se três argumentos a respeito da redução
generalizada da desigualdade da renda no Brasil e no restante da América Latina
na primeira década de século XXI:
1. o imperativo da
governabilidade – necessidade de garantir a legitimidade do Estado e a
estabilidade política – é determinante das políticas de redução da desigualdade
após duas décadas (1980-2000) marcadas por trajetórias de instabilidade e
crise, inclusive,
crises sistêmicas e
institucionais;
2. o objetivo de perpetuação no
poder dos grupos dirigentes é determinante de políticas de redução da desigualdade
(e de combate à pobreza) que rendem votos junto aos grupos favorecidos por
estas políticas – as políticas de redistribuição são funcionais na luta pelo
poder político; e,
3. a evolução favorável da
economia mundial, via afrouxamento da restrição das contas externas e das
contas públicas, é o condicionante básico no período 2003-08.
O estudo baseia-se em painel de
12 países da América Latina: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia,
Equador, Honduras, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela.
As variáveis para análise são o
coeficiente de Gini, que varia de 0 (completa igualdade) a 100 (máxima
concentração) e a razão da renda média per capita dos domicílios quintil 5 (20%
mais ricos) e quintil 1 (20% mais pobres)[iv].
As fontes de dados são: CEPAL
(Comissão Econômica para América Latina e Caribe)[v],
Banco Mundial[vi]
e FMI (Fundo Monetário Internacional)[vii].
Os dados referem-se, de modo
geral, ao período 2000-09. Os dados anuais para os coeficientes de desigualdade
que não estão disponíveis foram calculados por interpolação geométrica.
Os indicadores usados são:
variação média anual do coeficiente de Gini e variação média anual da razão da
renda média per capita dos domicílios quintil 5 (20% mais ricos) e quintil 1
(20% mais pobres). A metodologia é simples e consiste na análise da evolução da
média e da mediana.
Para ler o estudo por completo,
clicar AQUI.
[i] Professor titular do Instituto de
Economia da Universidade Federal
do Rio
de Janeiro.
[ii] Dados
do Banco Mundial (World Development Indicators database) mostram que no início
do século XXI o coeficiente médio de Gini para uma amostra de 104 países é de
39,2 e para uma amostra de 18 países latinoamericanos é de 51,7. Ver, ainda,
Baer e Maloney (1997) para o aumento da desigualdade da renda na América Latina
no final do século XX.
[iii] Naturalmente
é preciso cautela na comparação de indicadores da desigualdade da renda entre
países visto que as pesquisas por amostras de domicílios têm coberturas
diferentes; por exemplo, podem se basear em gastos ou renda, podem ser para
amostra nacional ou regional, área urbana, etc. Ademais, pesquisas de
domicílios subestimam rendas que são derivadas do capital (juro, lucro e
aluguel) e tendem a expressar a distribuição de rendimentos da classe
trabalhadora.
[iv] Estes
dados estão no Anexo, Tabelas A.1 e A.2
[v] Disponível:
http://websie.eclac.cl/sisgen/ConsultaIntegradaFlashProc.asp.
[vi] World
Development Indicadors, 2004
[vii] World Economic Outlook DataBase.
Disponível:
http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2011/01/weodata/index.aspx
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