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domingo, 17 de março de 2013

Novo alvo: ruralistas querem precarizar legislação trabalhista do campo

Foto extraída do blog Acerto de Contas.

A herança colonial brasileira resiste. Mesmo fora das formas originais de sua formação social, marcada pelo Plantation (trabalho escravo, monocultura, produção para o mercado externo e latifúndio), boa parte de seus elementos persiste, é o que atesta a nossa “vocação” para a produção agroexportadora e a existência do latifúndio. Não mais apresentado nos padrões escravocratas do latifúndio colonial - desde os anos 1950 este vestiu-se de agronegócio -, não perdeu sua essência de modernização conservadora, ou seja, manteve os padrões da industrialização do Japão e Alemanha, que passaram por esse processo através de alianças com as forças das oligarquias, ou no mesmo sentido aludido por Lênin quando caracteriza a “Via Prussiana”. (Almoço das Horas).
por José Coutinho Júnior
15 de março de 2013

A bancada ruralista, após alterar o Código Florestal para que este correspondesse aos interesses dos grandes produtores, se organiza agora para outra investida no Congresso Nacional: a alteração das leis trabalhistas do campo. Segundo dados da Frente Parlamentar de Agricultura (FPA), a bancada conta com 214 deputados e 14 senadores, o equivalente a 41,7% da Câmara e 17,3% do Senado.

De acordo com Paulo Márcio Araújo, coordenador técnico da FPA, "a ideia é discutir a questão trabalhista e buscar formas de estabelecer novas regras, que contemplem as especificidades do trabalho rural, de forma a garantir a segurança jurídica para os empregadores e, ao mesmo tempo, preservar e resguardar os direitos dos trabalhadores dentro do que se estabelece nas convenções internacionais e dentro do direito brasileiro."

As alterações sinalizadas pelos ruralistas mostram que a intenção da bancada é tornar as relações trabalhistas mais precárias.
De um lado, defendem o aumento da jornada de trabalho no período de colheita – para mais de 10 horas -, e ajustes no regime de terceirização dos trabalhadores. Ao tempo que são contrários aos projetos de lei (PLs) que exigem prévia autorização pela Vigilância Sanitária para o funcionamento de alojamentos rurais, e o que obriga o empregador a garantir a segurança de seus empregados e a fornecer equipamento individual, de autoria do deputado Dimas Fabiano (PP-MG) e da senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO), respectivamente.

De acordo com Xavier Plassat, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), as mudanças propostas pela bancada em relação ao trabalho fazem parte de “uma guerra ideológica que se iniciou quando os ruralistas perceberam que a alteração da lei penal, que define o conceito de trabalho escravo contemporâneo, aprovada em 2003, fez com que os fiscais passassem a adotar a norma e fiscalizar as condições de trabalho no campo de forma mais intensa”.

Lógica às avessas

A principal oposição da bancada, no entanto, ocorre contra a Norma Regulamentadora 31 (NR31), que contém 252 medidas que exige dos empregadores uma série de garantias. Dentre outras coisas, condições dignas de saúde, segurança e transporte aos trabalhadores. Além de alterações na NR31, os ruralistas também propõem que o poder para elaborar Normas Regulamentadoras passe do executivo ao legislativo, cabendo ao executivo apenas o papel de fiscalizá-las.

A senadora e presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Kátia Abreu (PSD-TO), declarou em relação à NR31 que "há muitos itens que, se retirados, não farão falta nem aos trabalhadores. Mas da forma como foi elaborada, a NR 31 não foi feita para beneficiar os trabalhadores, mas para punir o empregador. Com o trabalho, não vamos criticar ninguém. Só queremos mostrar que é impossível cumprir todas as 252 exigências".

Para Xavier, os argumentos dos ruralistas de que a NR31 apenas pune o empregador e não garante benefícios aos trabalhadores rurais não procede, pois os empregadores participaram da criação da norma.

“Na época em que a NR foi criada, fez-se uma ampla discussão com todos os setores envolvidos, inclusive os empregadores. Não é como dizem agora, que ‘quem fez a lei, não conhece a realidade do campo’, isso é um argumento de má fé gritante. Se a NR for alterada, seria dramático, pois temos nela parâmetros que dão um patamar mínimo de cidadania quando se está no meio do mato. Percebemos que os ruralistas não querem beneficiar o trabalhador, e sim lucrar mais ao tirar a obrigatoriedade de direitos trabalhistas”, afirma.

Trabalho precário

Para o presidente nacional da Comissão dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Wagner Gomes, o trabalho rural de fato tem suas especificidades se comparado ao trabalho urbano, mas é por esse motivo que a lei, caso seja alterada, deve acrescentar pontos para proteger ainda mais o trabalhador, e não flexibilizar os direitos. 

“O trabalho rural é mais penoso, pois os camponeses trabalham nas piores condições possíveis. Se compararmos um trabalhador rural e um trabalhador urbano com a mesma idade, o trabalhador rural vai aparentar ter o dobro da idade do trabalhador urbano. Não precisamos flexibilizar e tirar pontos das leis, precisamos de leis adicionais para melhorar a vida desses trabalhadores, pois não é fácil viver e trabalhar no campo”.

Xavier afirma que um dos fatores principais para as difíceis condições do trabalho no campo é a informalidade. “O trabalho rural é precarizado porque, mais do que qualquer outro, é informal. 70% dos trabalhadores rurais estão em condições de informalidade, e o argumento de que ‘no campo, como o trabalho é sazonal, não se assina carteira’, é nefasto, pois existem regimes de contratos temporários garantidos pela lei Nº 5.889/73, que regula o trabalho rural. Nós sabemos que, na verdade, os que precarizam o trabalho querem é pagar o menos possível a seus funcionários”, acredita.

Trabalho escravo

No ano passado, ocorreu a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 438/01, conhecida como PEC do trabalho escravo, que propõe o confisco de terras nas quais forem encontrados trabalhadores em condições análogas à escravidão, destinando-as para a Reforma Agrária. Aprovada na Câmara dos Deputados, o projeto se encontra parado no Senado, em grande parte por pressão da bancada ruralista, que exige uma revisão do atual conceito de “trabalho escravo”, alegando ser muito vago.

O artigo 149 do Código Penal brasileiro, atualizado em 11/12/2003, define o trabalho escravo contemporâneo da seguinte forma: “Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: (Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003).”

Segundo Wagner, “a atualização do conceito de trabalho escravo foi uma briga grande para poder aprovar, e agora eles querem alterar a definição para ficarem ilesos quando trabalhadores em condições degradantes forem encontrados nas grandes propriedades”.

Para Xavier, a alteração do conceito atual por parte da bancada ruralista seria um retrocesso. “Até 2003, o juiz que recebia uma denúncia de trabalho escravo, como a lei não especificava nada, cabia a ele interpretar, e essa interpretação, na maioria das vezes, estava relacionada apenas ao cerceamento da liberdade. Complementamos a lei adicionando ao trabalho escravo jornadas exaustivas e condições degradantes de trabalho. Foi um avanço, pois a nossa definição é até melhor que a definição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre trabalho escravo”.

Mobilizações

Para se contrapor às alterações que a bancada ruralista pretende fazer, as organizações sociais ligadas ao campo precisam começar a agir e debater o tema. Para Xavier, muitos sindicatos não estão acompanhando o debate, o que é problemático.

“Muitos sindicatos e organizações rurais não estão inteiradas do debate, porque há uma tentativa da CNA em confundir os agricultores. Basta ver a CNA tentando abocanhar dinheiro dos sindicatos rurais, para adequá-los a seus sistemas. Essa propaganda, que visa unificar o campo sob a bandeira de que ‘somos todos agricultores’, é uma tentativa ideológica de falar em nome da categoria e usar o pequeno agricultor para defender o grande. A CNA passa a se tornar, aos olhos de muitos, uma entidade aliada,e isso dificulta mobilizações contra as alterações”.

De acordo com Wagner, as entidades que estão a par do debate devem iniciar um trabalho de mobilização e denúncia da investida ruralista. “Quando os ruralistas começam a falar em mexer, não é para melhorar a vida dos trabalhadores, e sim piorar. Se os movimentos sociais e centrais sindicais não se organizarem, eles vão conseguir realizar as alterações que querem. Do jeito que a coisa está quieta, sem ninguém debatendo o tema, é desfavorável para nós. Precisamos botar a boca no trombone e evitar que os ruralistas façam valer seus interesses ao custo dos trabalhadores”.
Fonte: MST

Cresce trabalho em condições precárias na América Latina, diz OIT mar 10, 2008


por Cibelle Bouças
do Valor Econômico
Na última década, o Brasil fugiu à tendência de precarização do trabalho registrada na América Latina e Caribe e aproximou-se mais da tendência global de melhoria nas relações de trabalho. Levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revela que a América Latina foi a única região do mundo em que cresceu a participação de pessoas trabalhando em condições precárias entre 1997 e 2007.

De acordo com o estudo, 32,7% dos homens empregados na região trabalham sob condições ” vulneráveis ” em 2007. Dez anos antes, o percentual era de 30,1%. O índice de mulheres empregadas sob condições precárias também aumentou, ficando em 33,5% no ano passado, ante 32,1% em 1997.
A organização não divulgou dados sobre o Brasil. De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), entre 1998 e 2007 a participação média de trabalhadores sem carteira assinada nas capitais regrediu de 38,9% para 35,1%. ” Tivemos até 2003 um aumento na precarização do trabalho no Brasil, com queda de salário real médio e redução das contratações em carteira. Mas desde 2004 houve uma reversão do quadro ” , afirmou Clemente Ganz Lucio, diretor técnico do Dieese.

No mundo, a participação de homens em condições vulneráveis de trabalho baixou de 56,1% para 51,7% e a participação de mulheres sob as mesmas condições baixou de 50,7% para 48,7%. Em entrevista por telefone, Theodor Sparreboom, economista da OIT, considerou positivo o fato de o nível de precarização na América Latina ter ficado abaixo da média global. Para o economista, o aumento da contratação de pessoas sob condições vulneráveis é reflexo da baixa produtividade na América Latina.

”Nos últimos dez anos, a produtividade na região só cresceu 0,6% por ano, abaixo da média global. Falta dinamismo na economia e é difícil mudar o perfil de emprego para tipos mais produtivos e menos vulneráveis”, afirmou. Ele observa que os países da Ásia, especialmente a China, têm altos índices de emprego sob condições precárias – que variam de 52,3% a 84,2% da mão de obra total empregada – e também apresentam baixos índices de produtividade.

Para o economista, o crescimento da China como competidor internacional mantendo empregados em condições vulneráveis de trabalho preocupa, mas não deve se manter ao longo da década. ” Se existe uma relação sustentável entre empregados e empregadores é mais fácil para empresas investirem. O crescimento onde não se aumenta o número de empregados, não se formam pessoas, não é uma via sustentável no longo prazo ” , afirmou.

Sparreboom acredita que, nos próximos anos, a América Latina acompanhará as demais regiões e reduzirá o número de contratados sob condições precárias. ”Os investimentos em formação têm crescido, sobretudo no Brasil. A tendência é de melhora“.

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