Filial do Barclays em Paris,
banco acusado de deliberadamente
manipular a taxa Libor. Foto: REUTERS/Mal
Langsdon/Files
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por Julio Godoy
Paris, França, 26/7/2012 –
Meios de comunicação, dirigentes políticos e cidadãos europeus se voltam contra
os banqueiros, acusando-os, no melhor dos casos, de serem cúmplices de
inumeráveis operações ilegais, e, no pior, de diretamente serem criminosos. O
melhor exemplo desta onda de indignação é o uso da palavra “bankster”,
combinação de “banker” (banqueiro, em inglês) e gângster, inclusive utilizada
pelos meios de comunicação de países não anglo-saxões. O termo, cunhado durante
a crise econômica mundial conhecida como a Grande Depressão, dos anos 1920 e
1930, ressurgiu na mídia britânica em 2009, e apareceu agora na primeira página
do jornal francês Libération.
Em um breve documento sobre
política bancária divulgado no dia 21, o presidente do opositor Partido Social
Democrata (SPD) da Alemanha, Sigmar Gabriel, acusou os banqueiros de
“chantagearem governos e Estados com a ameaça de uma bancarrota com efeito
dominó”, de “cumplicidade com atividades criminosas”, como evasão de impostos e
lavagem de dinheiro, e de “prejudicarem seus próprios clientes”. Mesmo os
analistas que atribuem intenções populistas às críticas de Gabriel concordaram
que os diretores das grandes corporações financeiras privadas causaram grandes
prejuízos ao seu negócio e aos seus clientes. A lista de queixas é longa.
Nos Estados Unidos, o banco
HSBC é acusado de lavar dinheiro de narcotraficantes latino-americanos e de
organizações islâmicas supostamente envolvidas em atividades terroristas. Em um
comunicado divulgado no dia 17, o HSBC assume sua responsabilidade: “Houve
ocasiões em que o banco não pôde cumprir com os padrões que esperam os
reguladores e os clientes. Reconhecemos estes erros, respondemos por nossas
ações e nos comprometemos a solucionar o que não funcionou bem”.
O chamado escândalo Libor
(acrônimo em inglês de taxa interbancária oferecida de Londres) deixou clara a
conivência de numerosas instituições internacionais, entre elas Barclays,
Citigroup, JPMorgan Chase, UBS, Deutsch Bank, HSBC, para falsificar informação
sobre as taxas de juros interbancárias para que os bancos centrais fizessem o
mesmo com as suas. A taxa Libor é uma referência para o mercado monetário, fixada
pela Associação de Banqueiros Britânicos. O escândalo fez com que reguladores
britânicos e norte-americanos impusessem ao Barclays uma multa sem precedentes
de US$ 450 milhões, e levou à aposentadoria forçada de seu diretor, Bob
Diamond.
Além disso, as instituições
financeiras se viram envolvidas em uma grande confabulação de evasão fiscal. A
independente Rede de Justiça Fiscal, que investiga a evasão de impostos
internacional e o papel dos bancos nos paraísos fiscais, estima que cerca de
US$ 11,5 trilhões de ativos estão guardados em cofres de segurança, o que faz
com que os Estados deixem de arrecadar aproximadamente US$ 250 bilhões por ano.
Por sua vez, a Organização para
a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) destaca que “a evasão e a
fraude fiscal colocam em risco a arrecadação dos Estados”, e recorda que o
Senado dos Estados Unidos estima uma perda de US$ 100 bilhões por ano com
evasão fiscal cometida por pessoas e empresas nesse país. “Em muitas nações, as
quantias chegam a milhares de milhões de euros”, afirma a OCDE. “Isto significa
menos recursos para infraestrutura e serviços, como educação e saúde, e
prejudica os padrões de vida em economias desenvolvidas e em desenvolvimento”,
ressalta.
Os ativos estão em paraísos
fiscais, como os territórios britânicos Ilha de Man, Guernsey e Gibraltar, e
nas Ilhas Cayman e similares, embora também em instituições financeiras que
operam em cidades como Londres e Nova York, e, ainda, em países como Suíça,
Cingapura e Mônaco. Os crimes financeiros ocorrem quando os países do Norte
industrializado atravessam uma grave crise de dívida soberana que deixou muito
deles na bancarrota.
O problema teve origem, ou,
pelo menos, se agravou, com a crise financeira de 2007, precisamente porque os
bancos ficaram à beira da falência e tiveram de ser resgatados pelos Estados
para evitar a queda do sistema financeiro. No entanto, a ajuda só fez aumentar
e mover uma crise financeira cíclica, e agora bancos espanhóis, gregos e
cipriotas pedem ajuda dos governos nacionais, que sacrificam seus cidadãos
reduzindo o gasto com serviços públicos básicos como educação, saúde e
infraestrutura.
Tudo isso se faz para que os
mercados financeiros internacionais continuem operando quase sem regulação,
enquanto os “banksters” se atribuem salários principescos e bônus elevados. No
dia 18, o jornal Libération revelou que, em 2011, apenas quatro grandes bancos
franceses pagaram aos seus diretores 1,1 bilhão de euros (mais de US$ 1,3
bilhão) em bônus. A situação levou alguns políticos a reclamarem novas
regulações e novos controles para os mercados financeiros.
O ministro da Economia da
França, Pierre Moscovici, lançou uma reforma do setor com o objetivo de separar
os bancos comerciais das instituições financeiras e limitar os salários dos
diretores. Gabriel, do PSD, pediu um teto de salário e de bônus e a responsabilidade
pessoal de presidentes, diretores-gerais e gerentes de bancos quando as perdas
são causadas por transações especulativas de alto risco.
Medidas semelhantes foram
propostas pela Comissão Independente para os Bancos (ICB), criada em 2010 para
reformar o setor e promover a competição e a estabilidade financeira. Contudo,
as ideias não foram totalmente consideradas pelo novo plano do governo para
reestruturar o mercado financeiro, anunciado no começo deste mês, que, de todo
modo, não será implantado antes de 2019.
De fato, a maioria das medidas
discutidas na Alemanha, França e Grã-Bretanha está incluída no acordo da
Basileia III, último pacto normativo internacional para reforçar e regular a
estabilidade e a solvência do setor financeiro. A nova normativa do Comitê de
Supervisão Bancária da Basileia, ainda em discussão, será aplicada passo a
passo a partir de 2013 com vistas à sua total implantação em 2019.
Economistas independentes
afirmam que a demora em fixar novos controles a um setor obviamente corrupto
prova a falta de vontade política dos governos para chegar à raiz do problema.
Segundo o economista francês Paul Jorion, “após cinco anos da pior crise
financeira da história, todas as tentativas de regular os bancos e os fundos
são letra morta”. Por outro lado, “a União Europeia e os governos continuam
desregulando e deixando seus próprios cidadãos na miséria total”.
Fonte: Envolverde
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