CNI lança documento para 'contribuir' no debate sobre competitividade. Para empresas, direitos trabalhistas são irracionais (CC/Rodrigo Bertolino) |
Confederação da indústria chama direitos de 'irracionalidades',
e apresenta propostas que podem deteriorar qualidade do empregos. Dilma afirma
que governo combate custos da produção sem perda de direitos
por Raimundo Oliveira
Publicado em 04/12/2012, 22:45
São Paulo – A Confederação Nacional
da Indústria (CNI), a pretexto de tornar as empresas brasileiras mais
competitivas, quer repassar para a sociedade o gasto com garantias trabalhistas
mínimas que hoje competem aos empresários, diminuir o poder da Justiça do
Trabalho por meio de desregulamentação das leis que garantem direitos como
descanso aos domingos, jornadas de trabalho definidas por lei,
licença-maternidade, restrições ao trabalho noturno, multas rescisórias e
outros.
Uma cartilha da CNI, intitulada
101 Propostas para Modernização Trabalhista, apresenta como “irracionalidades”
garantias mínimas para os trabalhadores brasileiros ou compensações adotadas em
decorrências de perdas com mudanças na legislação ou com planos econômicos.
Segundo a CNI, as propostas
serão lançadas no 7º Encontro Nacional da Indústria (Enai), que será aberto
hoje (5) , em Brasília, com a presença de "cerca de 1,5 mil dirigentes
empresariais para discutir o futuro da indústria." A presidenta Dilma
Rousseff estará na abertura do encontro.
Sem direitos
A primeira “irracionalidade”
apontada pelos industriais é a prevalência do Poder Judiciário sobre convenções
e acordos coletivos firmados entre empresas e sindicatos ou trabalhadores. Para
a confederação, a invalidação de acordos por parte da Justiça causa insegurança
para as empresas.
A CNI também sugere, por
exemplo, a transferência para o sistema previdenciário de gastos com pagamento
de metade do salários devidos a funcionários que são ex-presidiários. Também
quer a isenção da contribuição previdenciária durante a licença-maternidade e a
transferência para o INSS de todos os outros encargos que são cobrados neste
caso, como FGTS e pagamento proporcional de férias e 13º salário.
'Diferente do contexto internacional'
A presidenta Dilma Rousseff
recebeu hoje, durante o 7º Encontro Nacional da Indústria, o documento com a
propostas da CNI para a legislação trabalhista. Em seu discurso, Dilma elencou
várias medidas que o governo vem buscando em favor da competitividade do setor
– como redução das tarifas de energia, dos juros, da carga tributária e
desoneração da contribuição patronal à Previdência. Mas foi categórica em
afirmar que esforço em diminuir os custos da produção se dá "sem perda de
direitos trabalhistas", assinalando discordar dos países que admitem essa
conduta diante do "contexto internacional".
A reportagem ouviu de fontes
ligadas ao Dieese, em análise preliminar do documento – na qual a confederação
alega pretender "preservar a discussão sobre proteção e os direitos
trabalhistas" – que em todas as propostas o que se vê é o contrário, um
ataque, algo como um capitalismo sem risco e sem custos.
Segundo análise do Dieese, a
maioria dos trabalhadores brasileiros não dispõe de estrutura sindical
suficientemente organizada, nem organização que os represente nos locais de
trabalho e consiga negociar em equilíbrio com as empresas. Os setores menos
organizados estariam sujeitos à imposição de acordos coletivos desfavoráveis e
teriam como principais mecanismos de proteção os direitos mínimos garantidos
por lei e o recurso à a Justiça.
Outra medida proposta pela CNI
é fixar em no máximo quatro anos a validade das convenções e acordos coletivos
e que as cláusulas convencionais não integrem o contrato de trabalho. De acordo
com avaliação do Dieese, por essa proposta, caso não haja ou expire um acordo
entre determinada empresa e seus funcionários, os patrões podem deixar de
cumprir o que eram obrigados e colocar os trabalhadores em situação de risco em
relação às garantias mínimas de ganhos e condições de trabalho.
A cartilha
anti-irracionalidades da confederação empresarial também sugere regulamentar
jornadas de trabalho de até 12 horas diárias com compensação semanal ou mensal
e intervalo legal mínimo entre as jornadas. Segundo o documento, a proposta tem
como objetivo adequar as jornadas de trabalho às reais necessidades da empresa,
com segurança jurídica. Na análise extra-oficial do Dieese, a proposta iguala
trabalhadores a máquinas e não leva em conta o desgaste e a maior exposição aos
riscos de ocorrência de acidentes.
A garantia do domingo como
repouso semanal remunerado e as folgas nos dias de feriado são igualmente
irracionais, de acordo com a proposta. O empresariado alega que essa restrição
tem impacto na produção e na competitividade das empresas. Previsto na
legislação trabalhista brasileira desde 1949, o descanso remunerado só pode ser
alterado permanentemente do domingo para outro dia da semana em algumas
categorias.
Outra medida polêmica
apresentada pela confederação é a permissão de terceirização de qualquer
atividade. Atualmente, a interpretação corrente do movimento sindical e de boa
parte dos juristas é de que é vetada a terceirização das consideradas
atividades-fim.
Alegando “prejuízos
irreparáveis” à imagem e o risco de ter restrições a empréstimos na rede
bancária para empresas que vão parar na "lista suja" do trabalho
escravo no Ministério do Trabalho, a CNI propõe também que sejam definidos
critérios legais "adequados" para caracterizar trabalho escravo.
A modernização trabalhista
imaginada pela entidade patronal prevê ainda a criação de um “fundo
antidesemprego”, nos moldes do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), mas
custeado pelos trabalhadores. A proposta é que o fundo seja usado em época de
crise e pague uma parte do trabalho, entre 60% e 70% do salário, e que os
trabalhadores estejam sujeitos a oportunidades de treinamento e prestação de
serviços públicos, “uma vez que estarão recebendo sem a efetiva contraprestação
efetiva do trabalho”.
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