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quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Neste Janeiro (2013): o Almoço das Horas hibernará


Caros internautas,
Janeiro inteiro estarei desocupado, usufruindo de minhas férias e desconectado de tudo, inclusive do Blog e das redes sociais virtuais. Assim, desculpem quanto aos posts dos comentários. Devem aguardar meu retorno.
Desejo a todos e todas boas festas de fim de ano e férias (para os que estarão gozando). Ainda não superamos o capitalismo e devo estar revigorado o bastante para ser explorado por este feroz, atroz nefasto sistema.
No entanto, o Blog não sairá do ar, apesar de não sofrer atualizações, senão no final de janeiro de 2013. Aproveitem para explorar o que perderam das postagens antigas do Blog (no rodapé).
Hasta breve!!!
Rubens Mascarenhas

Investigação descobre fraude da blogueira cubana Yoani Sánchez

Origem da foto-montagem: rededemocratica.org

Jornal do Brasil
Jorge Lourenço

Velha opositora do governo cubano, a blogueira Yoani Sánchez teve um dos seus truques revelados pelo jornalista francês Salim Lamrani. De acordo com uma investigação conduzida por ele, o perfil de Yoani Sánchez no Twitter é artificialmente "bombado" por milhares de perfis falsos.

Generación Y

Sob o nome de Generación Y, o mesmo do blog que a deixou famosa, o perfil de Yoani no microblog tem 214 mil seguidores. Considerada pela mídia estrangeira como "influente", ela é seguida por apenas 32 cubanos. Mas as estranhezas não param por aí.

Super-seguidora

Yoani segue 80 mil pessoas no Twitter, um número completamente descabido. Conforme Salim Lamrani apurou, a blogueira cubana usa sites de troca de seguidores para aumentá-los e parecer mais popular na internet. Em troca de receber novos usuários, ela precisa segui-los. Daí a razão para seguir 80 mil perfis no Twitter.

Super-seguidora II

A fraude da cubana não para por aí. Do total, cerca de 47 mil seguidores do Yoani são falsos. São usuários que não são seguidos por ninguém, não seguem ninguém mais exceto a própria blogueira e sequer têm fotos de perfil.

O medo chama

Vazamentos recentes do Wikileaks indicam que o sucesso de Yoani na internet também tem o dedo do governo norte-americano. Nas correspondências, funcionários do governo americano mostram preocupação com as mensagens pessoais da blogueiras, que poderiam comprometê-la internacionalmente.

Escândalo abafado

A cubana, aliás, protagonizou um dos momentos mais pitorescos da imprensa internacional nos últimos anos. Ela convocou vários jornalistas para uma coletiva de imprensa na qual explicaria um suposto sequestro seguido de espancamento em público. Os agressores seriam integrantes do governo de Fidel Castro.

Só que Yoani apareceu na coletiva sem qualquer traço de agressão no corpo, não soube explicar como as manchas sumiram num intervalo de 24 horas e não apresentou qualquer testemunha.

Stella Calloni: “Desinformação é a arma de guerra do Pentágono”

"Democratização da comunicação é
estratégica para integração latino-americana"
"Democratização da comunicação é estratégica para integração latino-americana"

Renomada jornalista alerta que, seguindo o script de Washington, Clarín ataca a Ley de Medios da Argentina “a mais democrática e participativa da América Latina”

Aos 77 anos, Stella Calloni luta o bom combate, energizando com alegria tudo ao redor. Nos recebe em sua casa mateando para falar sobre a Lei de Meios Audiovisuais da Argentina, a Ley de Medios. Seus fascinantes olhos azuis abrem uma pequena janela sobre a batalha travada por ela contra o imperialismo. Um sorriso sincero de quem sabe que a militância é feita com leveza e por que não, bom humor. Sua voz firme deixa clara a complexidade e importância do que está contando.

Por Leonardo Wexell Severo
e Vanessa Silva,
de Buenos Aires - Argentina

A sala em que nos recebeu, repleta de quadros e imagens de diversos países, completa a aura internacionalista e integracionista que marca nossa conversa. O tema é o 7D, que colocou o debate sobre a comunicação na ordem do dia e mobilizou toda a sociedade argentina. Na última sexta-feira, 7, o maior conglomerado de comunicação do país vizinho, o Grupo Clarín, deveria ter apresentado seu plano de adequação para desfazer-se de seu monopólio e adequar-se à lei. Todos os demais grupos de mídia o fizeram até a data, mas por uma ação do Clarín, acolhida por uma corte de Justiça, a quem o grupo financiou viagens a Miami, o 7D não se consumou e a batalha pela democratização da palavra continua.

Veterana e premiada escritora e  jornalista, Stella desvendou a Operação Condor e tantos crimes macabros cometidos pelo imperialismo e seus testas-de-ferro no Sul do Continente. Stella estudou a fundo a lei dos meios e afirma categoricamente que se trata da “mais democrática e participativa da América Latina”, e tem um “significado especial para a conquista da soberania efetiva e o avanço da própria integração”. Frente ao festival de mentiras, calúnias e omissões que proliferam na imprensa contra a presidenta Cristina Kirchner e a nova lei, Stela nos convida a uma reflexão sobre quem se beneficia do caos na comunicação: “A desinformação é uma arma de guerra do Pentágono”.

ComunicaSul: Da mesma forma que O Globo, no Brasil, o Grupo Clarín foi claramente beneficiado pela ditadura. Como isso se deu?
Stella Calloni: Em 1978 a ditadura persegue a família do banqueiro e dono da empresa Papel Prensa, Davir Graiver, (empresa que detinha o monopólio da fabricação de papel jornal) acusado de trabalhar com o grupo guerrilheiro Montoneiros. O proprietário morreu num estranho acidente em 1976, no México, e nunca se pôde achar o corpo nem nada. A suspeita é que o assassinato tenha sido executado pela CIA e por grupos secretos que trabalhavam com a ditadura. Então, numa manobra entre a ditadura, o Diário Clarín, o La Nación e o diário La Razón, que já não existe mais, fizeram o “acordo” com Graiver. Tudo assinado e sua esposa Lidia Papaleo de Graiver, que regressou ao país com sua filhinha de dois anos, foi detida e torturada num centro clandestino. Nessas condições, teve que assinar a “venda” da Papel Prensa.  A “compra” foi por um montante que era nada e ocorreu, evidentemente, mediante extorsão. Do total do patrimônio, 80% ficaram para os três jornais e uns 20% da empresa para o Estado. Foi assim que o Clarín e o La Nación começaram a formar seu monopólio, pois quem tem o poder do papel jornal na mão tem o poder da distribuição deste papel. Em 1980, o regime da ditadura militar (1976-1983) dita por decreto a lei de radiodifusão que, neste momento, já concebia a comunicação como uma mercadoria. A ditadura havia aberto então a porta para a conformação de grandes grupos monopólicos.

Terminada a ditadura, o presidente Raúl Alfonsín chegou a questionar esta anomalia.
Depois de 1983, após a Guerra das Malvinas, cai a ditadura e Raul Alfonsín chega à Presidência. Em 1984 ele começa a se dar conta que a lei de meios da ditadura precisaria mudar. Então é desatada uma grande campanha do Grupo Clarín contra Alfonsín e nada avança. É esta a lei que se encontra em vigência até agora.

Como inicia esse movimento pela democratização da comunicação?
Nos anos 1990 começa um trabalho coletivo de universidades, diretórios estudantis, profissionais, movimentos sociais e sindicais, sobretudo de profissionais de imprensa, entre eles a União de Trabalhadores de Jornalistas de Buenos Aires. Iniciam o debate sobre o tema da concentração de poder nos meios de comunicação. Vale lembrar que, em 1989, o ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) privatiza tudo, além de um montão de meios de comunicação, escancarando as portas para a possibilidade de se comprar a quantidade de licenças que quisessem. Isso possibilita que, em 1995, quando começou a campanha para mudar a lei, Clarín já tivesse se tornado um grupo monopólico.

Qual o tamanho desse monopólio?
Beneficiado com esta lógica privatista, no ano 2000 Clarín já detinha 240 licenças, os canais 13, Toda Notícia, Volver, Rádio Mitre AM, 80 FM, Multicanal, Datamarket, por meio dos quais controlava quase todo o país, além de imprimir o principal diário, o Clarín, e o Olé, que é uma revista esportiva. Havia acumulado, portanto, bem mais do que todo o resto dos grupos.

No Brasil, o grupo Folha emprestava seus automóveis para a repressão. De que forma o Grupo Clarín agiu?
Este é um problema. O Clarín e os grandes meios colaboraram com a ditadura publicando como “enfrentamento” o assassinato de militantes pelos grupos policiais. É a velha história: a mídia fazia o jogo do poder econômico, dos latifundiários, dos banqueiros, das multinacionais, que manipulavam em todo o continente os meios de comunicação, ligados aos Estados Unidos, dependentes deles. Assim, quando os EUA viam que seus interesses estavam sendo contrariados, e que precisavam dar um golpe e invadir um país, utilizavam a mídia local. Foi assim na invasão a Guatemala, foi dessa forma que converteram o herói nicaraguense Augusto César Sandino em bandido. Por isso atacam tanto atualmente o presidente equatoriano Rafael Correa. O que está em jogo é a defesa dos interesses econômicos. Concebem a informação como mercadoria e a liberdade de expressão como liberdade de empresa. O que potencializou esse movimento foi o furacão neoliberal dos anos 1990.

Que vitimou bastante a economia Argentina...
A Argentina foi um dos países mais gravemente afetados pelo neoliberalismo. Acabaram os trens no nosso país. É uma coisa única no mundo, porque tínhamos cobertas nossas maiores extensões. Com isso morreram vários povoados no interior. Foi um retrocesso nos princípios iniciais da República, foram quebradas muitas empresas. O governo chegou a cortar publicidade para quebrar empresas de comunicação, a fim de que viessem os estrangeiros e seus testas-de-ferro, o que foi conformando um poder hegemônico. Foram apoderando-se, no caso da Europa, das agências de notícias, mancomunadas com interesses privados a tal ponto que perderam totalmente a espécie de independência que ainda tinham. Vocês como brasileiros, nós como argentinos, lembramos que quando tivemos as ditaduras recorríamos àquelas agências para fazer denúncias. Hoje elas são parte de um só discurso midiático.

Como avalia o papel dos novos governos populares nesta batalha pela liberdade de expressão?
Devido às mudanças que ocorreram na América Latina, vivemos o pós-neoliberalismo - ainda que este sistema não esteja completamente enterrado. O fato é que surgiram governos que expressam uma vontade popular totalmente distinta. Estes governos surgem das lutas populares nas ruas, nas estradas, e ressignificam a tragédia do neoliberalismo nos setores mais renegados e excluídos entre os excluídos. Afinal, os neoliberais concebem o desemprego como um disciplinador social, por isso, trataram de reduzir os sindicatos, debilitaram as defesas dos trabalhadores, desregulamentaram nossas economias. E a resposta veio da grande massa popular, dos piqueteiros na Argentina, por exemplo.

O mesmo aconteceu na Bolívia, e na Venezuela com o Caracaço em 1989, que foi a primeira rebelião anti-neoliberal produzida no continente. Os novos governos que surgem, como o de Hugo Chávez, vêm quando os países estavam afundados no abismo. Daí tantas rebeliões populares e a entrada em cena de Evo Morales na Bolívia, Nestor Kirchner na Argentina, Lula no Brasil, Manuel Zelaya em Honduras, a volta de Daniel Ortega na Nicarágua. São governos frutos destas rebeliões que mudam o mapa da América Latina, em contraposição à lógica das ditaduras que nos implantaram os Estados Unidos. Começa então um processo de integração e unidade. Isso dá um salto além do processo de integração econômica, como havia sido inicialmente concebido, para um processo de emancipação nacional, porque estamos em um processo de independência, ainda não temos nossa independência totalmente assegurada.

E então temos a conformação de grandes conglomerados de mídia para bloquear este avanço.
Temos o fenômeno de uma enorme concentração dos grandes meios de comunicação, dos donos do poder com os meios em suas mãos. Então vai ficando claro que para darmos alguns passos inevitáveis temos de enfrentar o poder hegemônico, cotidiana e sistematicamente. A mídia se diz o quarto poder, mas não do Estado, e sim do privado, do poder econômico.

O golpe na Venezuela foi chave para vermos o golpe dos meios, um golpe de estado midiático, porque foi dirigido pela mídia, é ela quem passava as instruções, por meio dela se desacreditava a figura do presidente. Aquele curto golpe, mais cívico que militar, está bem relatado no documentário “A Revolução não será Televisionada”. Ali vê-se com muita claridade o papel dos meios e pode-se analisar não só o que é a desinformação, a manipulação midiática, como os seus silêncios.

Também se fazem ouvir pelos seus silêncios...
Pedro Carmona já havia caído, estava o golpe derrotado por um povo nas ruas, e tínhamos canais na Argentina que não registravam o retorno de Chávez. Todo o processo foi um grande laboratório para a mídia.

Como profissional que acompanha o debate sobre a democratização da comunicação há muitos anos, qual a sua avaliação sobre a Ley de Medios?
A Lei de Meios da Argentina é a mais democrática e participativa que se votou no país e, creio, em toda a América Latina. As diferentes organizações estão trabalhando nela, constantemente aperfeiçoando a proposta há 22 anos. Há uma grande aprendizagem, fruto de um acúmulo.

A questão da mídia, pela sua capacidade de interferência na realidade, de pautar governos e influir no comportamento social, ganhou ainda maior relevância para a própria democracia.
Claro. Se antes existiam três meios potentes que destruíam um governo, neste período histórico temos milhares de repetidores destes meios potentes que têm um poder tão grande que agora são concebidos pelo Pentágono como arma de guerra. A desinformação hoje é uma arma de guerra. Massivamente pode-se destruir um mandatário, convertê-lo em ditador, sustentar uma mentira como as armas de destruição em massa no Iraque, uma mentira atroz como a usada contra a Líbia. Muammar El Kadafi nunca bombardeou seu povo. Não deixaram nada em pé na Líbia. Então a mídia foi usada recentemente em quatro guerras coloniais: Afeganistão, Iraque, Líbia e, agora, a Síria, onde também estão produzindo devastação em larga escala. Temos também a questão grave dos bombardeios e do cerco a Gaza, na Palestina, países que foram divididos como o Sudão, e ameaçados, como o Líbano e o Irã.

Vejam como isso se reflete aqui na América Latina com a nova ofensiva dos grandes conglomerados de comunicação sobre os governos da região, tentando destruir a integração que conseguiu vencê-los. Nossa integração conseguiu parar golpes de Estado como o dado contra Evo, apoiou [Rafael] Correa e isolou os golpistas em 2010, desconheceu o governo ditatorial de Honduras e tomou uma decisão, como no caso do Paraguai, cumprindo com o regramento do Mercosul que defende a democracia verdadeira. Concebemos e reafirmamos a democracia como é: uma grande participação popular, e pela primeira vez os Estados Unidos caíram na sua própria armadilha. Não diziam que o que valia era o voto na urna? Pois pelo voto nossos povos afirmaram um caminho independente do governo de Washington. Como a vontade popular é favorável à independência, temos uma verdadeira guerra instalada no Continente, a guerra dos meios.

Voltando à Argentina, conte-nos mais sobre a guerra que está sendo travada pela mídia contra o governo de Cristina.
Na Argentina há uma desinformação enorme. Em 2008 quando o governo quis colocar um imposto para a venda da soja, pois havia uma entrada enorme de dinheiro, foi produzida uma tentativa de golpe de Estado. A paralisação das rodovias do Mercosul era um golpe estratégico. Conseguiu-se superar isso, mas a desinformação era  tão grande que começou a confundir setores da sociedade, que são ainda cativos dos grandes meios, porque nenhum meio estatal tem o poder comunicacional deles, que abarcam todo o país. Com 240 licenças, o Grupo Clarín tem rádios de longo alcance em cada província, chegando até a Terra do Fogo, a mais distante. Conhecemos pela história de Goebbels e do nazismo, que tudo o que é repetido todos os dias vai formando uma verdade, uma opinião, que pode ser absolutamente equivocada. Como ocorreu com o povo alemão, as informações de Goebbels foram levando os alemães à sua própria destruição, pois não conseguiram ver que era falsa a mensagem.


Em seu jardim, uma de suas paixões
A destruição da consciência, de países e povos, via desinformação...
Aqui a desinformação é tamanha que ao ler o Clarín, da primeira à última página, são todas notícias negativas sobre a lei de meios. Chegou a um ponto que nunca havíamos chegado, de se oporem ao governo quando este defende a questão das Ilhas Malvinas, que são estratégicas não só para Argentina, como para toda a América Latina, porque senão teremos as maiores bases estrangeiras já instaladas, com alcance para o Brasil, para toda a região. Diante desta ameaça real, esses meios começam a desacreditar esta vontade, esta posição do governo, dizendo que é preciso respeitar os habitantes instalados no lugar, trazidos da Grã Bretanha. Querem justificar a falta de soberania, defender uma colônia a 14 mil quilômetros da Grã Bretanha, instalada em águas territoriais argentinas. No caso dos fundos abutres chegam a defendê-los em manchete. Mas não falam do pagamento de dívidas que não são de nossos governos, que nossos presidentes inclusive baixaram o endividamento externo de forma considerável, e que estão pagando a dívida do passado.

Esse é um comportamento que vem de longa data.
Veja, o La Nación é da família Mitre, oligárquica do passado, que sempre combateu os governos populares, tendo sido chaves na derrubada de Perón, em 1955. São sociedades cativas que se acostumaram a ter muito poder através desses meios. Mentem para este público dizendo que o jornal vai deixar de sair no dia seguinte à entrada em vigor da Ley de Medios. Mas no caso do jornal não há nenhum problema, pois a lei não tem alcance para os meios escritos. Isso é absolutamente falso. Eles podem ficar com até 24 canais e 10 rádios, mas não poderão ficar com as 240 concessões irregulares, porque isso é monopólio. A lei se rege também por regras da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que afirma que não pode haver monopólios informativos porque eles restringem a liberdade de expressão dos países. Então nos perguntamos: por que esta lei não está sendo cumprida pela SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa)? Porque ela representa os donos dos meios.

No caso argentino, após amplo debate, aprovada pelo Executivo e pelo Legislativo, a lei foi obstaculizada pelo Judiciário. O que deve acontecer agora?
A lei entrou como projeto do governo, apresentada por todas estas organizações. Os deputados estudam a questão e a lei é aprovada por maioria pelo governo e pela oposição em outubro de 2009. De imediato, o Clarín começa a colocar medidas cautelares. Pressiona por uma medida cautelar para o artigo 161, que regula os monopólios midiáticos, que não deveriam mais existir e que todos os grupos deveriam se adequar. A lei não é nenhum ataque a um meio determinado. Tanto é assim que no dia 6 de dezembro, um dia antes do prazo, 19 grupos já haviam entregado seus planos de adequação para o governo. Havia um acerto que no dia 7 de dezembro a Autoridade Federal de Serviços Audiovisuais de Comunicação (AFSCA) devia apresentar um plano de adequação para os que não cumprissem o prazo. Então uma Câmara Civil e Comercial integrada por juízes que têm até relação familiar com o Clarín, um juiz que foi convidado pelo grupo para ir a Miami fazer um debate contra a nova lei, suspende seu efeito.

Uma decisão em causa própria.
É impossível que uma pessoa possa ser juiz e parte, mas aconteceu. Um monopólio restringe a liberdade de informação e o Estado deve tomar medidas contra a intenção monopolista. E foi obstaculizado por uma decisão judicial. Nos enfrentamos com uma verdade que ninguém quer dizer em toda a América Latina, na Argentina, no Brasil: a Justiça está impregnada pelo passado. Ainda restaram muitos juízes da ditadura, do poder econômico que veio depois, juízes que colaboram ativamente com as oposições locais. Houve casos em que atrasavam todos os julgamentos em defesa de direitos humanos, que postergavam decisões por tempo indeterminado. Foi o que aconteceu com o juiz Bissordi que tinha comunicação com os militares da ditadura e atrasava os juízos. Como a Justiça não se depurou, segue com ilhas de independência, não do Estado, mas dos poderes econômicos.

É importante ressaltar que quando se fala deste tema, não é só o Estado que assegura que uma Justiça é independente ou não, mas os meios econômicos, os latifundiários, o sistema financeiro nacional e internacional. No caso do Equador e da Bolívia a mídia é ainda controlada pelos bancos. Esta é uma guerra dos povos.

Uma guerra pela democratização da comunicação. Dessa forma, como avalia o papel desempenhado pela SIP?
A luta pela democratização da mídia é a mãe de todas as batalhas. A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), que é a sociedade de todos os donos da mídia do continente, que tem grande influência dos Estados Unidos, está contra a Ley de Medios porque ela favorece a pluralidade de vozes, estabelece um limite para o número de licenças que cada grupo de empresários pode ter. A nova lei argentina determina que o Clarín não pode manipular tantos sinais, criou a AFSCA, determinou um máximo de 24 licenças de televisão por cabo e 10 de rádio AM ou televisão aberta para cada grupo, reconheceu o direito à comunicação com identidade dos povos originários, entre outros avanços. Na manhã de sábado, 8 de dezembro, começou a funcionar a primeira televisão mapuche e há mais de 20 rádios que passaram a ser feitas pelos próprios povos originários. Estou contentíssima com isso.

O monopólio do ar é como os latifúndios agrícolas, para distribuir frequências é necessário que o espaço radioelétrico não esteja ocupado. Ou seja, sem romper com o monopólio do Clarín não é possível que a lei entre em vigor...
A lei indica que tudo devia começar com os aspirantes aos canais apresentando-se como cooperativas. E assim foi feito. Mas se não se rompe o monopólio, não tem como distribuir. Este é o problema. Já se permitiu a abertura de novas rádios em alguns lugares, apoiou-se pela primeira vez o desenvolvimento de pequenas e médias empresas que poderão ficar responsáveis por um canal de cabo. 50 universidades já podem ter a sua própria televisão, foram liberadas mais de 365 licenças de AM e FM e devem sair outras 800 solicitações de distintos setores populares para rádio. Isso já está sendo cumprindo, com licenças para organizações sem fins de lucro, canais educativos, de saúde, 1.150 frequências para rádios municipais, se abriram mais de 130 rádios em escolas e para mais de 20 de povos originários. Mais de 50 cooperativas de serviços públicos em todo o país já têm sua licença e outras 100 as solicitaram. Isso dá uma ideia do que vai acontecer no dia seguinte ao que o monopólio acabar.

Um dos pontos que as entidades populares e os movimentos pela democratização levantam como essencial para a manutenção de meios não comerciais é o financiamento. Como a nova legislação aborda a questão da publicidade?
A lei exige que a publicidade incentive a produção local. Assim se produziram mais de duas mil horas de conteúdo televisivo desde que chegaram os planos de fomento do Estado nacional e mais de 3.500 projetos se apresentaram em todo o país. Com recursos, 26 das novas séries de televisão foram realizadas nas províncias com atores e técnicos locais. A indústria audiovisual gera mais de 100 mil postos de trabalho/ano em todo o país, número que pode ser bastante ampliado com a diversificação estimulada pela lei. As pequenas e médias empresas (Pymes) já contam com mais de 2.800 horas diárias de programação e geram mais de seis mil postos de trabalho. Esta informação obviamente não é divulgada pela mídia, mas as pessoas necessitam ter a dimensão do seu significado.

A grande mídia esconde os benefícios da nova lei, mas seus defensores conseguem dialogar sobre a sua relevância para o avanço da democracia?
Dizem que ela é necessária, falam da democratização, mas não são divulgados fatos concretos, não se demonstra a importância de fato. O artigo 161 é importantíssimo porque, como já disse, sem mexer no monopólio não tem como distribuir. Então a decisão da Corte em favor do Clarín está interferindo no processo. Os demais grupos de mídia estão dispostos a cumprir a lei, mas a SIP vem à Argentina apoiar o grande monopólio, num dos maiores atos de intromissão nos assuntos internos de um país. Aqui, no dia 22 de maio, a Corte Suprema fixou que no 7 de dezembro venceria a medida cautelar. Agora, com o apoio de alguns juízes, conseguiram novamente protelar. O Clarín está burlando a legislação com acompanhamento externo e o Estado está lutando contra a velha justiça que responde ao poder econômico.

Em sua opinião, o que temos pela frente?
Em primeiro lugar, precisamos tornar mais didáticas as denúncias contra o grupo monopolista. Se o Clarín continua sem cumprir a lei, o Estado está obrigado a chamar concursos públicos. As licenças que excedam o mínimo estipulado pela lei devem ser entregues a novos titulares. A obrigação do Estado é chamar o concurso. Se não adequar-se ao processo, em sua luta equivocada o Clarín terminará favorecendo os setores populares.

Inclusive agora está em curso um processo judicial pelo caso da fábrica de papel jornal, onde os antigos donos estão denunciando como lhes tiraram, de forma ilegal e indevida, seu patrimônio. A atuação é juridicamente reprovável porque se fez com pessoas detidas. Além disso, houve o descumprimento do que dispunha a lei quanto ao percentual de ações que deveria ter ficado com o Estado e que acabou sendo apropriado pelos grupos privados. O monopólio também amplia o poder e os lucros do Clarín, que obriga as demais publicações a pagarem um fundo para que possam ser distribuídas nas bancas. O Estado tem dito e repetido que não vai expropriar de nenhuma maneira, nem vai estatizar. Trata-se de garantir a pluralidade de vozes, algo que nunca houve. Ao contrário, uma quantidade de meios foram fechados durante a ditadura, inclusive com bombas, como o Diário Sur e o diário La Calle, do Partido Comunista. Há mais de cem jornalistas argentinos desaparecidos e 50 assassinados. Mas sobre isso a SIP não fala, como nada tem dito sobre o que está ocorrendo em Honduras onde em duas manifestações realizadas pela oposição foram espancadas equipes inteiras de televisão.

Novamente com o silêncio cúmplice da SIP.
A SIP estimula o silêncio. Há uma desinformação abismal na mídia, que também trabalha contra Chávez, tenta fazer permanentemente com que Brasil e Argentina briguem. Estão sempre divulgando “porque Dilma disse”, “se suspeita que”. Estão tratando de quebrar a integração e isso é gravíssimo. Chegaram inclusive a defender os fundos abutres, afirmando que os Estados Unidos teriam o direito de cobrar de países afundados o valor de face de títulos. A Argentina disse que não. Enquanto isso, ninguém sabe nada sobre as melhores coisas que estão acontecendo. E ainda temos  setores de esquerda que se unem à direita. Os meios de comunicação da direita lhes dão espaço, logicamente, pois escolhem a esquerda que lhes serve. E aqui os trotskistas cumprem este papel, fazem um grande favor à reação.

E como é possível romper com este cerco midiático?
Precisamos fazer cumprir o que diz a Corte Interamericana: os monopólios de comunicação cerceiam a liberdade de expressão. Quando os governos querem atuar para democratizar a palavra, se fazem de desentendidos. A informação é uma arma real para o poder hegemônico, uma arma para destituir governos. Uma arma tão real que muitas das notícias são fabricadas no próprio Pentágono, como as do Oriente Médio, e repetidas em todo o mundo. Imagine o poder que significa que, em todo o mundo, na mesma hora, se esteja repetindo a mesma coisa. Isso amplifica de uma forma perversa, eu diria terrorista, a desinformação. Não se respeita o direito dos povos a uma informação veraz, que ajude a população a ter mais educação e cultura. A isso se agrega os entretenimentos que são o maior modelo de desculturação que tiveram nossos países nos últimos anos. E isso é mais grave porque chega onde não há um jornal. Está em frente à televisão está absorvendo anti-valores.
Para continuar lendo a entrevista, clicar COMUNICASUL

Robôs e magnatas ladrões


Paul Krugman*
Embora a economia ndos EUA esteja em depressão, os lucros das corporações batem recordes. Os lucros sobem cada vez mais às custas dos trabalhadores. Há duas explicações plausíveis para isso, sendo ambas verdadeiras até certo ponto. Uma diz que a tecnologia colocou os trabalhadores em desvantagem; a segunda que estamos sofrendo os efeitos de uma monopolização e da ação dos "robber barons" ("magnatas ladrões", termo usado para caracterizar os capitalistas do século XIX"). O artigo é de Paul Krugman.

A economia norte-americana está, segundo a maioria dos indicadores, em profunda depressão. Mas os lucros das corporações estão batendo recordes. Como isso é possível? Simples: os lucros sobem enquanto salários e compensações por trabalho caem. O bolo não está crescendo da maneira que deveria, mas o capital vai muito bem obrigado por apanhar um pedaço enorme dele. Às custas dos trabalhadores.
Espere, nós realmente voltamos a tratar da relação capital versus trabalho? Essa não é uma discussão fora de moda, quase marxista, para nossa moderníssima economia? Bem, muita gente pensa assim. Para as últimas gerações, discussões sobre desigualdade recaíam não na relação capital-trabalho, mas em questões de distribuição de renda entre trabalhadores. Essas questões, porém, talvez não tenham mais tanto a nos dizer.
Isto é, embora seja inegável que o pessoal do mercado financeiro continua a ganhar dinheiro que nem bandidos – em parte porque, como sabemos, alguns são bandidos – a diferença salarial entre os trabalhadores com curso superior e sem curso superior, que cresceu muito nos anos 1980 e no começo dos 90, não mudou muito desde então. De fato, os que se graduaram mais recentemente tiveram seus rendimentos estagnados mesmo antes da chegada da crise. Os lucros sobem cada vez mais às custas dos trabalhadores, inclusive daqueles que supostamente prosperariam no mercado atual.
Por que isso está acontecendo? Ao que sei, há duas explicações plausíveis, sendo ambas verdadeiras até certo ponto. Uma diz que a tecnologia colocou os trabalhadores em desvantagem; a segunda que estamos sofrendo os efeitos de uma monopolização. Imaginemos que há robôs de um lado, ‘robber barons’ (termo muito usado para caracterizar os grandes capitalistas do século XIX que, traduzido livremente, significa magnatas ladrões) de outro.
Primeiramente, os robôs. Não resta dúvidas de que, em algumas das mais expressivas indústrias do mundo, a tecnologia está tomando o lugar de todos, ou de quase todos, os tipos de trabalhadores. Por exemplo, um dos motivos pelos quais fábricas de alta tecnologia estão voltando para os EUA é que as placas-mães, as mais importantes das pecas de computadores, são essencialmente feitas por robôs. A mão de obra asiática barata deixou de ser um motivo para que elas sejam produzidas no exterior.
Num livro recente, Race Against the Machine (Corrida Contra a Máquina), Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee, ambos do Massachusets Institute of Technology, argumentam que histórias similares podem ser contadas sobre outras áreas, como as de tradução e pesquisa jurídica. O que mais impressiona dos exemplos apresentados no livro é que cargos de alta remuneração e especialização andam sendo encerrados, nem só os subalternos são vítimas da tecnologia.
Todavia, a inovação e o progresso podem realmente prejudicar um grande número de trabalhadores, talvez até os trabalhadores em geral? Eu costumo me deparar com declarações de que isso é impossível. A verdade, no entanto, desmente essas afirmações. Economistas sérios sabem disso há quase dois séculos. David Ricardo, economista do início do século XIX, é mais conhecido por sua teoria da vantagem comparativa, que oferece boas razões para o exercício do livre-mercado. Mas o mesmo livro que apresenta tal teoria incluía um capítulo sobre como as tecnologias da Revolução Industrial poderiam piorar a situação dos trabalhadores, pelo menos durante um tempo – que posteriores estudos sugerem ter durado décadas.
E quanto aos robber barons? Não se fala muito sobre monopólio atualmente. Toda a ação que se opunha ou servia para regular os monopólios foi colapsada durante os anos Reagan e disso nós nunca nos recuperamos. Contudo, Barry Lynn e Phillip Longman da New America Foundation defendem, muito persuasivamente na minha opinião, que a monopolização é um fator crucial para a estagnação do trabalho, visto que as corporações usam de seu poder para aumentar preços sem repassar ganhos para os empregados.
É difícil saber quanto da desvalorização do trabalho é explicada pela tecnologia ou pela monopolização, em parte porque há pouca discussão sobre o que está acontecendo. Eu penso ser justo dizer que o deslocamento dos proventos do trabalho para o capital ainda não ocupa o lugar devido na discussão sobre a economia norte-americana.
Esse deslocamento, porém, está acontecendo e implica em muita coisa. Por exemplo, há um impulso enorme e generosamente financiado no sentido da redução dos impostos sobre as corporações. É possível desejarmos isso numa época em que o lucro cresce a despeito dos interesses dos trabalhadores? E o que dizer do movimento de redução do imposto sobre heranças? Uma vez que nós estamos caminhando em direção a um mundo em que o capital financeiro, não a formação ou a perícia, determina a renda, é possível desejarmos facilitar a herança de grandes riquezas?
Como eu disse, esta discussão mal começou. Mas é hora de fazê-lo, ou os robôs e os robber barons transformarão nossa sociedade em algo irreconhecível.

* Professor de Economia e Relações Internacionais na Universidade de Princeton e escrever regularmente para o New York Times. Krugman recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 2008.

Tradução de André Cristi
Fonte: Carta Maior

Saber viver


Governismo, a vertente tupiniquim do stalinismo e o sopão dos pobres


Raphael Tsavkko Garcia*  
Sexta, 21 de dezembro de 2012

É interessante notar que desde que começamos, eu e o @elcapeto, a alimentar o a página Governismo, a doença infantil... as pérolas fanáticas dos governistas não pararam de chegar; na verdade, a coisa vem piorando, chegando ao machismo, racismo, outros preconceitos lamentáveis e teorias conspiratórias sem pé nem cabeça.
Mas algo tem me chamado a atenção há alguns dias: a guerra civil que começa a crescer no seio dos governistas. Não que não sejam todos fanáticos, mas parece que há gradações. Desde bestas completas que não veem problema em passar por cima de qualquer um pelo dito desenvolvimento dilmista, através, por exemplo, da defesa fanática de Belo Monte, até a quem critique pontualmente, por exemplo, a aliança com Maluf ou o PP na Habitação de São Paulo – sem que isto abale seu apoio geral a tudo que faz ou manda o partido.
A questão é que, agora, estes que criticam minimamente têm sido ferozmente atacados pelos mais fanatizados, por aqueles que acham que Lula é deus e que o caminho lulista é a única resposta para os problemas da humanidade. Gente que sempre foi governista e/ou petista tem sido duramente atacada por essa horda de acéfalos que apenas sabem repetir ordens da direção. Uns chegam a ser chamados de Cabo Anselmo!
E a coisa é realmente feia, com acusações de traição, de falso petismo e rompimento de amizades e relações. Não à toa o Governismo, a doença infantil... tem tido menos pérolas nos últimos dias: os esforços parecem concentrados nos expurgos que os fanáticos tentam orquestrar contra os moderados (se é que podem ser chamados assim).
E chamar de "expurgo" não é de graça. A semelhança não apenas com o stalinismo, como com outras ideologias de supremacia (ideológica, racial, étnica, etc.) é clara. Repete-se fanaticamente, sem qualquer crítica, aquilo que vem de cima, da direção. Mesmo que as ordens sejam para que se esqueça todo o passado, tudo o que se defendia antes – antiprivatismo, direitos humanos etc. Limita-se a obedecer e encontrar maneiras de justificar – mesmo que seja impossível – porque seu partido, sua direção e mesmo você mudaram de ideia, ou melhor, se negam a aceitar que mudaram de ideia.
O ponto alto é dizer que SEMPRE defenderam o que estão fazendo, no máximo alterem o nome (chamando privatização de concessão) e, quando for impossível defender, mudar o nome ou disfarçar, atacando o interlocutor de tucano, de vendido, de antipatriota etc.
Quando não for possível sustentar a defesa de algo tão absurdo como, por exemplo, remoções forçadas para obras feitas sob medida para a máfia da FIFA, a máfia do PMDB, acusem o interlocutor.

Caso recente é o da re-privatização das empresas do setor elétrico patrocinada por Dilma. A maioria dos fanáticos e dos portais ligados ao PT, ao invés de criticar a privatização repetida – e desta vez pior, pois sequer o Congresso é consultado – se limita a acusar o PSDB de não querer se juntar à farra.
Obviamente, como já disse em artigo passado, o PSDB se recusa a se juntar à farra por birra, mas é sintomático. O PT copia FHC sem o menor problema, mas seus ‘militontos’ garantem o discurso de que são diferentes, mascarando a realidade e criando um mundo de fantasia que só eles enxergam – mas tentam impor aos demais.
Meu temor é que estes expurgos acabem por piorar a situação. Mesmo que caminhando para o fanatismo e cegos para muitas coisas, os mais moderados têm o papel de, ao menos, servir como uma barreira de contenção do fanatismo máximo. Mas estão falhando e sendo suplantados.
Podemos chamar estes fanáticos de stalinistas, mas outros termos servem da mesma forma. Como querem posar de esquerda, ainda que não sejam, e no fim apenas acabam denegrindo a imagem da esquerda, uso o termo.
Governo privatiza? O discurso é que vai "salvar" o povo, que não é privatização, é concessão. Governo é corresponsável pelos massacres contra indígenas? Oras, quem se importa com aqueles nômades invisíveis?
A ideologia por detrás nada mais é que o lulo-dilmismo (uma mistura de teoria lulista com práxis dilmista, talvez?). Ideologia esta que se entende por um misto de sopão aos pobres com incentivos pesados ao capitalismo, aliado a um entreguismo ímpar.
Em outras palavras, entrega-se ao pobre aquilo que é mínimo para sua sobrevivência, o básico do assistencialismo (que é necessário, diga-se de passagem), mas chega a um ponto em que fica só nisso e tudo que vem depois é precarizado, feito nas coxas – vide ProUni, que de boa ideia descambou para garantir crescimento de UniEsquinas ao invés de incentivar educação de qualidade.
E, passadas as necessidades mais básicas, resta o consumismo. O incentivo perpétuo a se ter mais, acumular. Ter uma TV de LCD e computador ultramoderno, mas morando em favela sem saneamento básico. Afinal, saneamento é caro, a TV mais barata e, quem sabe, serve como cala-boca e garante votos.
De um necessário assistencialismo passamos para o consumismo incentivado e defendido com orgulho.
Uma classe média de 291 reais – que não é classe média nem aqui e nem no inferno –, cujo mantra é repetido à exaustão até que vire verdade.
Se não pode convencer sem argumentos, repete-se incansavelmente, até que, por osmose, sigam o que a direção do partido mandar.
E é óbvio que o assistencialismo – via Estado – tem outras intenções. O povo com mais dinheiro consome, gasta dinheiro com os parceiros e financiadores de campanha do partido. Partido este que, além de incentivar o consumismo, garante o princípio do toma lá dá cá com seus patrocinadores, através de projetos megalomaníacos reavivados da Ditadura ou fazendo vista grossa a abusos sistemáticos aos direitos humanos.
Aliás, um aparte: a ministra Maria do Rosário é uma das figuras mais patéticas da República com seu discurso simplesmente inverossímil de defesa dos Direitos Humanos, ao passo que genocídios são lugar comum no país e o governo não prepara uma única política para melhorar a situação. Indígenas, LGBTs, população negra... Nada. Dilma pessoalmente faz questão de agradar aliados e vetar políticas a favor de índios e LGBTs.
Um governo aliado de Katia Abreu, Bolsonaro, Malafaia, Igreja Universal e Cia. não pode governar para o povo e para as minorias. Não faz "propaganda de opção sexual", enquanto gays morrem como moscas e ultrapassamos o recorde de mortes, não demarca terras e garante a segurança das diversas tribos ameaçadas pelo país, pois, oras, índio atrapalha o progresso. Bom mesmo é que suas terras sejam usadas para mineração, soja ou hidrelétricas mil. E não surpreende almoço com militares e afagos aos bandidos enquanto quem foi torturado, perdeu amigos e parentes continua nas ruas tentando reparação e justiça.
Dilma só recebe quem tem poder – e farda.
Democratização das comunicações? Respeito aos direitos humanos?
Desmilitarização da polícia? Memória e justiça e revogação da Lei da Anistia?
Direitos reprodutivos? Direitos LGBTs? Direitos indígenas? Educação de qualidade para todos e todas? Salários decentes para professores?
Assuntos irrelevantes no entender governista. Mais importante é privatizar e garantir lucros ao Eike.
Mas, voltando, o lulo-dilmismo conseguiu o que parecia impossível. FHC apenas conseguia contentar os ricos, deixando trabalhadores com ódio e pobres abandonados, mas Lula e a Dilma, com pesada propaganda e dinheiro para a grande mídia e seus parceiros, conseguiram unir políticas assistencialistas eficazes e necessárias com lucros históricos para todos os principais setores capitalistas do país, ao passo que, graças ao esforço imenso dos seus fanáticos pagos e não-pagos, retira direitos atrás de direitos dos trabalhadores – privatização da previdência dos funcionários públicos, pretensão de flexibilizar a CLT, além das já conhecidas desonerações da folha.
Chegamos num ponto, porém, em que o processo de aprofundamento do capitalismo, do mais violento, no país acabou por causar algum desconforto entre as hostes menos fanáticas do governismo. É o momento em que veremos qual grupo prevalecerá. Pessoalmente não tenho dúvida de que o mais fanatizado irá prevalecer, e os mais moderados irão ter de se contentar a serem sacos de pancada ou abandonar o partido.
Para a maioria, prevejo a conformação e a piada de que "lutam internamente", um eufemismo para "iremos fingir discordar internamente, mas votaremos TUDO com o governo", só que cada vez mais enfraquecidos, cada vez menores e cada vez menos eficazes e conscientes.
Estamos beirando um totalitarismo dentro do chamado "campo governista" e meu temor é que se espalhe, que transcenda esse campo já tão frágil em termos de resistência. Sou e sempre serei defensor de democratização das mídias, mas o que vemos hoje, em geral, é uma luta entre a mídia próxima do PT e a grande mídia, com raras exceções no meio. Lutas sociais são colocadas de lado em nome da governabilidade, direitos humanos são relativizados e, neste cenário, temo que tipo de processo de "democratização" possa vir de um governo que governa pro capital e dá migalhas ao povo.
O mesmo vale para a "reforma política". Oras, com esta base aliada que tudo pode, que tudo ganha mesmo que não se preocupe em votar com o governo para justificar todas as benesses, imaginem a maravilha que sairia a tal reforma!
(E tem quem chame de voto de cabresto a mera exigência de que "aliados" sejam... aliados! Na hora de privatizar o PMDB não vota "errado", mas pra questões populares...)
Ano que vem a Dilma já declarou que seu objetivo é reduzir impostos. Educação? Direitos Humanos?
Não, reduzir impostos. E pra isso não se importa em privatizar, em subsidiar lucros das empresas, em manipular discursos sem, no fim, realizar uma necessária reforma tributária. É o Estado renunciando a arrecadar, mas sem mexer no lucro dos amigos empresários. Temos a produção de carro mais barata do mundo, para dar apenas um exemplo, mas pagamos o valor mais alto do mundo pelo produto final. O governo? Oras, reduz IPI, ou seja, impostos, pra baixar o preço de forma irrisória, ao invés de FORÇAR uma menor margem de lucro às montadoras.
O Estado renuncia arrecadação (no caso criando um caos em municípios), mas mexer no lucro dos empresários? NUNCA! Isso seria de esquerda!
Militontos não cansam de xingarem o STF, não cansam de xingarem qualquer opositor dentro ou fora do partido, mas batem palmas para higienismo e políticas genocidas, repetindo cegamente que "quem não está conosco, é de direita", mesmo que o PT de hoje cause invejas ao PSDB que nunca conseguiu manipular tão perfeitamente as massas. É um nível de fanatismo que beira ou roça no totalitarismo.
* Jornalista e blogueiro, formado em Relações Internacionais (PUC-SP), é mestre em Comunicação (Cásper Líbero).

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Linhas de montagem de produtos Apple na China têm 'gerenciamento militar', mostra canal francês

Imagem do ''Envoyé Especial'' mostra dormitório
 na Foxconn; oito pessoas dormem por quarto

Do UOL, em São Paulo
17/12/201212h55

O programa francês "Envoyé Especial" (Enviado Especial, em tradução livre), veiculado pelo canal France 2, mostra que pouco mudou nas fábricas da Foxconn após a montadora de eletrônicos chinesa, responsável pela fabricação de gadgets da Apple, se comprometer a melhorar as condições de trabalho de seus funcionários.
Veiculada na última quinta (13), a reportagem é chamada de "e-Germinal: no inferno das usinas chinesas", em uma referência ao romance Germinal de Émile Zola, que retrata o sofrimento dos mineiros de carvão na França no século 19. O vídeo mostra imagens feitas por duas pessoas infiltradas em fábricas na China da Foxconn -- a companhia se recusou a permitir a entrada dos jornalistas.
Segundo a reportagem, o sistema de produção da Foxconn, que emprega 1,4 milhão de pessoas na China, funciona à base de um "gerenciamento militar" nas fábricas, "onde os insultos são cotidianos e os dormitórios insalubres".
Não há imagens da linha de produção porque os funcionários são obrigados a deixar todos objetos "metálicos", incluindo celulares, em armários antes de começar a trabalhar. Eles não podem usar relógios e não há relógios nas paredes da fábrica. "O tempo não passa. É desesperador", conta a mulher que trabalhou infiltrada.
"Nós tínhamos de trabalhar durante a madrugada, durante oito horas. O turno terminaria às 5h da manhã, mas daí eles decidiram acrescentar mais duas horas de trabalho. Nós tivemos apenas uma pausa, mais ou menos às 23h. E o trabalho é sempre repetir o mesmo gesto", conta o outro infiltrado.

Dormitórios insalubres
Depois do trabalho, todos retornam ao dormitório, diz ele, "mas não conversam uns com os outros". São oito pessoas por quarto, equipados com beliches sem colchões. Há uma sala de TV – um pequeno aparelho pendurado na parede – com fileiras de bancos de madeira. Alguns dos dormitórios ainda estão sendo construídos, mas já estão ocupados por trabalhadores da Foxconn, mesmo sem haver eletricidade ou elevadores.
O salário, de cerca de 220 euros (cerca de R$ 605), é bem maior do que esses trabalhadores conseguiriam trabalhando em suas províncias de origem. "Mas não chegamos a receber isso. Descontam 14 euros do dormitório, 50 da refeição e mais dinheiro do seguro", diz a mulher infiltrada.
A reportagem conclui que as más condições de trabalho tem como origem o atendimento à demanda de produção do iPhone 5. O smartphone é tido como mais difícil de ser produzido quando comparado aos seus antecessores – tão difícil que a Foxconn tem de contratar novos funcionários "incansavelmente" para substituir os trabalhadores que deixam, "frustrados", a linha de montagem.

A Foxconn não quis comentar as imagens feitas pelo canal de TV francês. A Apple informou ao programa que "as empresas subcontratadas são obrigadas a fornecer condições de trabalho seguras, dignidade e respeito aos funcionários".

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Questões ao Papai Noel

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NADA É IMPOSSÍVEL DE MUDAR


Desconfiai do mais trivial,
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural,
nada deve parecer impossível de mudar.
(Bertold Brecht)

Ao shopping center


Poema de José Paulo Paes, extraído do livro "PROSAS seguidas de ODES MÍNIMAS". Cia das Letras. 1992.

El Vaticano, la pobreza y Haití


Vicenç Navarro*
A la vez que Benedicto XVI alentaba en Madrid a los jóvenes en la Jornada Mundial de la Juventud a que se dedicaran a servir a los pobres, siguiendo supuestamente las enseñanzas de la Iglesia católica, se publicó en una revista de Haití (el país con un porcentaje mayor de su población viviendo en situación de pobreza), llamada Haïti Liberté, unos datos hasta entonces confidenciales, dados a conocer por Wikileaks, sobre la activa intervención del Vaticano en aquel país para impedir el desarrollo de políticas encaminadas a erradicar la pobreza, lideradas por el expresidente Jean-Bertrand Aristide, que deseaba volver desde su exilio para continuar desarrollándolas.
En realidad, lo ocurrido en Haití es muy representativo de lo que ha ocurrido en países mal llamados “pobres”. Haití no es un país pobre. En realidad, es rico, siendo su tierra enormemente fértil. Durante muchos años fue uno de los mayores productores del mundo de café y azúcar. A pesar de ello, la gran mayoría de la población es muy pobre. Y la causa de ello es la enorme concentración de las tierras y del crédito en manos de una oligarquía que ha regido el país desde hace muchos años.
Conjuntamente con las familias que constituían la oligarquía, ha existido un entramado internacional –dirigido por EEUU, Francia y también por el Vaticano– que ha mantenido a aquel país en la pobreza. Una de ellas fue la familia Duvalier, a la que la Madre Teresa –que será beatificada pronto– definió, por cierto, como “el gran amigo de los pobres” (por haber donado dinero a un programa caritativo dirigido por tal figura católica en Haití). Tal familia, enormemente corrupta y cruel, asesinó a más de 60.000 opositores. Una rebelión popular forzó su caída y huida del país. Así fue como surgió el Gobierno Aristide, que inició las únicas reformas progresistas que aquel país ha conocido, que incluyeron una reforma agraria, la reforestación de las tierras, la sindicalización del sector textil y el aumento de los salarios. Tales reformas afectaron inevitablemente los intereses de tal oligarquía (incluyendo los de la Iglesia católica, que había sido uno de sus pilares ideológicos), lo que creó grandes resistencias, que culminaron con un golpe militar, apoyado, de nuevo, por EEUU y Francia, y también por el Vaticano. Más de 3.000 personas murieron en aquel golpe, muchos de ellos militantes del partido político del presidente Aristide. Se inició también entonces una campaña internacional mediática para desprestigiar a Aristide, acusándole de traficar con drogas (sin que nunca se aportaran datos que apoyaran tales acusaciones).
Las fuerzas militares de EEUU desplazaron físicamente al presidente Aristide a Sudáfrica, donde permaneció exiliado, y desde donde intentó en múltiples ocasiones poder volver a su país, lo cual no fue posible debido a la oposición activa del Gobierno estadounidense, del Gobierno francés y también del Vaticano. El diario Haïti Liberté ha publicado las comunicaciones, hasta ahora secretas, entre oficiales de la diplomacia estadounidense, francesa y del Vaticano que muestran la campaña internacional orquestada por tales estados a fin de desacreditar a Aristide e impedir su vuelta a Haití. El intento queda claramente indicado en una escucha secreta a la embajadora de EEUU en Haití, Janet Sanderson, en la que explícitamente indica que: “Es importante impedir el resurgimiento populista y antieconomía de mercado que se originaría con la vuelta de Aristide”.
Desafortunadamente, las tropas de Naciones Unidas están contribuyendo a esta labor. Escuchas hechas públicas ahora muestran también cómo el oficial guatemalteco, representante de las Naciones Unidas en Haití, trabajó estrechamente con el Gobierno de EEUU con el objetivo de evitar la vuelta de Aristide e imposibilitar el resurgir del movimiento Lavalle pro Aristide, que continuó prohibido en Haití, no permitiéndosele que participara en las elecciones fraudulentas que se han estado realizando en aquel país. El anterior secretario general de Naciones Unidas, Kofi Annan, presionó al Gobierno de Thabo Mbeki de Suráfrica para que retuviera a Aristide y no le permitiera volver a Haití, ya que supuestamente originaría lo que el Vaticano, en otra escucha, definió como una “catástrofe”. El subsecretario de la diplomacia vaticana, monseñor Ettore Balestrero, en una comunicación con el arzobispo de Haití, Bernardito Auza, subrayó lo catastrófico que sería para Haití la vuelta de Aristide. Bernardito Auza insistió en la necesidad de que el Vaticano se pusiera en contacto con las autoridades eclesiásticas católicas en Sudáfrica para que presionaran a fin de que Aristide no volviera a Haití. El Vaticano actuó con plena coordinación con el Departamento de Estado de EEUU.
El problema de esta movilización internacional es que la población de Haití tiene memoria. Según los datos del propio embajador de EEUU, Aristide continuaba siendo (en 2005) “la única figura en Haití que tenía un apoyo favorable por encima del 50% de la población”. De ahí la constante oposición a que Duvalier volviera a Haití.
Mientras, las medidas a favor de expandir la “economía de mercado”, que tales autoridades han favorecido para Haití, con la eliminación de medidas proteccionistas, han significado la invasión en el mercado de productos alimenticios procedentes de EEUU, destruyendo la economía nativa de Haití. Políticamente, las últimas elecciones fraudulentas (en las que participó sólo el 24% del electorado) mostraron que el sistema político carecía de legitimidad. El permiso del Gobierno de Haití al dictador Duvalier de volver a Haití creó una movilización nacional e internacional de oposición tal que el Gobierno la intentó paliar permitiendo la vuelta de Aristide, aunque el establishment de Haití (incluyendo la Iglesia católica) obstaculiza el desarrollo auténticamente democrático que permitiría a Aristide y a su partido volver al poder.
* Catedrático de Políticas Públicas de la Universidad Pompeu Fabra.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Por que não festejo e me faz mal o Natal


por MÁRIO MAESTRI  
SÁBADO, 26 DE DEZEMBRO DE 2009
 
Não festejo e me faz mal o natal por diversas razões, algumas fracas, outras mais fortes. Primeiro, sou ateu praticante e, sobretudo, adulto. Portanto, não participo da solução fácil e infantil de responsabilizar entidade superior, o tal de "pai eterno", pelos desastres espirituais e materiais de cuja produção e, sobretudo, necessária reparação, nós mesmos, humanos, somos responsáveis.

Sobretudo como historiador, não vejo como celebrar o natalício de personagem sobre o qual quase não temos informação positiva e não sabemos nada sobre a data, local e condições de nascimento. Personagem que, confesso, não me é simpático, mesmo na narrativa mítico-religiosa, pois amarelou na hora de liderar seu povo, mandando-o pagar o exigido pelo invasor romano: "Dai a deus o que é de deus, dai a César, o que é de César"!

O Natal me faz mal por constituir promoção mercadológica escandalosa que invade crescentemente o mundo exigindo que, sob a pena da imediata sanção moral e afetiva, a população, seja qual for o credo, caso o tenha, presenteie familiares, amigos, superiores e subalternos, para o gáudio do comércio e tristeza de suas finanças, numa redução miserável do valor do sentimento ao custo do presente.

Não festejo e me desgosta o Natal por ser momento de ritual mecânico de hipócrita fraternidade que, em vez de fortalecer a solidariedade agonizante em cada um de nós, reforça a pretensão da redenção e do poder do indivíduo, maldição mitológica do liberalismo, simbolizada na excelência do aniversariante, exclusivo e único demiurgo dos males sociais e espirituais da humanidade.

Desgosta-me o caráter antissocial e exclusivista de celebração que reúne egoísta apenas os membros da família restrita, mesmo os que não se frequentaram e se suportaram durante o ano vencido, e não o farão, no ano vindouro. Festa que acolhe somente os estrangeiros incorporados por vínculos matrimoniais ao grupo familiar excelente, expulsos da cerimônia apenas ousam romper aqueles liames.

Horroriza-me o sentimento de falsa e melosa fraternidade geral, com que nos intoxica com impudícia crescente a grande mídia, ano após ano, quando a celebração aproxima-se, no contexto da contraditória santificação social do egoísmo e do individualismo. Ao igual dos armistícios natalinos das grandes guerras, que reforçavam, e ainda reforçam - vide o peru de Bush, no Iraque -, o consenso sobre a bondade dos valores que justificavam o massacre de cada dia, interrompendo-o por uma noite apenas.

Não festejo o Natal porque, desde criança, como creio para muitíssimos de nós, a festa, não sei muito bem por que, constituía um momento de tensão e angústia, talvez por prometer sentimentos de paz e fraternidade há muito perdidos, substituindo-os pela comilança indigesta e a abertura sôfrega de presentes, ciumentamente cotejados com os cantos dos olhos aos dos outros presenteados.

Por tudo isso, celebro, sim, o Primeiro do Ano, festa plebeia, hedonista, aberta a todos, sem discursos melosos, celebrada na praça e na rua, no virar da noite, ao pipocar dos fogos lançados contra os céus. Celebro o Primeiro do Ano, tradição pagã, sem religião e cor, quando os extrovertidos abraçam os mais próximos e os introvertidos levantam tímidos a taça aos estranhos, despedindo-se com esperança de um ano mais ou menos pesado, mais ou menos frutífero, mais ou menos sofrido, na certeza renovada de que, enquanto houver vida e luta, haverá esperança.

Mário Maestri é historiador.