Modelo político e econômico que ela
ajudou difundir na década de 1980 resultou no mundo de extrema desigualdade em
que estamos mergulhados hoje
Por Paulo Nogueira
no Diário do Centro do
Mundo
9 de abril de 2013
A maior vitória de Margaret
Thatcher, morta hoje aos 87 anos depois de um derrame, foi não ter assistido à
formidável falência do mundo que ela ajudou tão poderosamente a construir na
década de 1980.
Fazia anos que Thatcher sofria
de problemas mentais. Conforme relatou num livro sua filha Carol, ela chamava
com frequência seu marido Denis, morto há muitos anos.
Ela não viu a desagregação do
que se convencionou chamar de neoliberalismo – um sistema que acabou levando ao
célebre mundo dos 99% versus 1%.
Thatcher de um lado do
Atlântico e Ronald Reagan de outro comandaram com influência mundial – sentida
no Brasil de Collor e mais ainda no de FHC – modelos econômicos que acabaram
privilegiando enormemente os superricos e as grandes corporações.
A grande crise econômica do
final da década passada mostrou o quanto era insustentável este modelo, a começar pelo fato de que os cofres públicos
em tantos países se esvaziaram por conta
de políticas que permitiram aos bilionários e às multinacionais encontrar
formas legais – embora imorais – de reduzir a quase nada os impostos a pagar.
Thatcher viveu pela política, e
começou a morrer quando foi traída por companheiros do Partido Conservador e
derrubada depois de 11 anos de poder, em 1990.
A mulher que em 1979 se
instalou no Número 10, como os ingleses chamam a casa do primeiro ministro, era
uma força da natureza. Chegou declamando São Francisco de Assis, mas agiu como
uma ninja no poder.
Derrotou os sindicalistas
superpoderosos que frequentemente paravam o Reino Unido, deu uma surra
fulminante nos militares argentinos que queriam tomar as Malvinas, ajudou a
cravar os pregos no caixão da União Soviética e liderou um movimento global de
privatização e desregulamentação com resultados que o tempo provou serem
catastróficos.
Margaret Thatcher pareceu, em
certos momentos, maior que o Reino Unido. Seu único rival em prestígio, entre
os líderes globais, era Reagan. Mas, se
Reagan parecia um ator de Hollywood fazendo o papel de presidente americano,
Thatcher era 100% realidade, ele embalagem, ela conteúdo.
Thatcher agarrou-se
desesperadamente ao poder quando já era uma primeira ministra morta em
atividade. Desafiada na liderança dos conservadores em 1990, não conseguiu a os
votos necessários para permanecer como líder, embora tenha vencido seu
oponente. Foi uma vitória inútil, mas Thatcher não quis ver isso.
No Reino Unido, o poder fica na
mão do líder do partido mais votado. Os companheiros de partido podem, em
situações extremas, desafiar a liderança.
Foi isso que tirou da Thatcher do poder.
Seus liderados entre os conservadores já não suportavam sua brutalidade
como chefe, e um deles a desafiou.
Thatcher, sem votos suficientes
para permanecer a despeito de ter batido o desafiador, ainda relutou durante
dias em deixar Downing Street. Queria ir para a segunda e decisiva votação. Era
formalmente uma possibilidade, mas na verdade é uma atitude não aceita na
política britânica, pelo desrespeito implícito à vontade coletiva do partido.
Foi a rainha Elizabeth quem afinal convenceu Thatcher a renunciar.
Os problemas mentais ceifaram
depois seu projeto de fazer fortuna com palestras e, muito pior para ela, a
impediram de lutar no campo das ideias pela essência do thatcherismo: um Estado
mínimo, com a menor regulamentação possível.
Em 2011, a convite do premiê
conservador David Cameron, ela visitou pela última vez Downing Street, o lugar
de onde ela exerceu influência mundial durante onze anos.
Andava com dificuldade e
acenava confusamente, como se de alguma forma tivesse em sua mente destruída
retornado aos dias em que foi conhecida como Dama de Ferro.
Morreu como a mãe do 1% e a madrasta
dos 99%.
Fonte: Outras
Mídias
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