Por Lúcio Flávio Pinto
Cartas
da Amazônia
Qui, 7 de fev de 2013
Em 1975 a hidrelétrica de
Tucuruí, a quarta maior do mundo, começou a ser construída no Pará. Dez anos
depois ela foi inaugurada. Foi uma das maiores obras públicas da história do
Brasil, a mais cara da Amazônia. Projetada inicialmente para custar 2,1 bilhões
de dólares, no final seu valor se multiplicara por cinco, passando de US$ 10
bilhões.
Já a fortuna do dono da
empreiteira principal da obra, a Camargo Corrêa, “apenas” dobrou. Em 1975,
Sebastião Camargo tinha uma fortuna pessoal calculada em US$ 500 milhões. Dez
anos depois ele se tornou o primeiro bilionário brasileiro.
A usina hidrelétrica, que
garante 8% de todo consumo de energia do país, com seus quase 200 milhões de
habitantes, lhe permitira embolsar meio bilhão de dólares, em valor não
atualizado.
Quando se abriu a última década
do século XX, as listas das revistas americanas Fortune e Forbes incluíam
apenas três bilionários brasileiros: Antonio Ermírio de Moraes, cabeça da
principal família de industriais brasileiros, e Roberto Marinho, imperador das
comunicações com sua Rede Globo de Televisão, além de Camargo.
Ao final do governo tucano de
Fernando Henrique Cardoso, eram oito. Quando Lula passou o bastão presidencial
à correligionária, Dilma Roussef, a lista passara a 30. No ano passado chegou a
35. A soma das fortunas individuais desses bilionários equivalia à metade do
que amealhou o homem mais rico do planeta.
Por coincidência, o mexicano
Carlos Slim, que tem na carteira US$ 69 bilhões, é dono das operadoras de
telefonia Claro e Embratel nesse Brasil que se tornou terreno fértil para
imensos ganhos pessoais.
Eike Batista, com apenas 55
anos, um jovem na companhia de anciãos podres de rico da seleta confraria, era
o cabeça do ranking, em março do ano passado, com seus US$ 34,5 bilhões. Mas
ontem seu patrimônio já era de pouco menos da metade, US$ 10,7 bilhões.
Nesse dia 7 ele perdeu US$ 300
milhões com a queda das ações da principal das suas seis empresas de capital
aberto, sempre com um X no nome, a OGX. Segundo a agência de notícias americana
Bloomberg, ele caiu fora da roda dos 100 homens mais ricos da Terra.
No curso de um ano a OGX,
perdeu mais de três quartos do seu valor porque sua produção, depois de tantos
anúncios mirabolantes, frustrou todas as expectativas, principalmente a de
Eike. Os analistas mais bondosos justificaram a queda contínua e grande do
patrimônio do empresário atribuindo-a ao seu excesso de otimismo.
Essa exagerada autoconfiança o
teria levado a prever resultados sem base real. Como a de que passaria o
mexicano Slim em 2015. A meta já era difícil de alcançar quando seu patrimônio
era metade da foruna do concorrente. Agora é quase sete vezes menor.
Com mais realismo nas suas
ações, acreditam esses analistas compreensivos, Eike Batista retomará a roda da
fortuna e voltará ao topo. Ele seria a personificação do genuíno ricaço dos
tempos do novo trabalhismo no poder, personificado pelo PT.
Ganhou muito dinheiro por ser
um autêntico empreendedor, apostar nas riquezas do país, arriscar investimentos
na produção e ter uma visão mais ampla e sensível da atividade empresarial. Um
bilionário do bem, conforme o jargão maniqueísta dos nossos tempos de retórica
de camuflagem. Embora uma das duas empresas que atuam no porto de Açu, a LLX,
tenha sido acusada pelo governo do Rio de Janeiro de causar danos ao meio
ambiente. E multada.
Por trás da pantomima do
marketing, verifica-se que o sucesso começa com boas – ou mesmo privilegiadas,
no sentido estritamente técnico da expressão – informações, a maior parte delas
proveniente do aparato estatal.
É também na administração
pública que esses empreendedores (na Rússia mais diretamente conhecidos por
“barões ladrões”, com ênfase nos produtores de petróleo do Mar Cáspio, o
equivalente do Pré-Sal dos Eikes Batistas et caterva neste país varonil) vão
buscar seus quadros de gestão.
Duplo uso de informações
privilegiadas, pois.
No caso de Eike, com a decisiva
participação do pai, Eliezer Batista, ex-ministro de vários governos e
presidente da ex-estatal Companhia Vale do Rio Doce, artífice de grandes investimentos
públicos em logística, infraestrutura e produção, sobretudo de commodities.
A ascensão súbita e exponencial
desses ricaços, quando se confronta seus ganhos através da manipulação de
papéis com o balanço real de seu ingresso no processo produtivo, expressa uma
nova modalidade de associação entre o governo e a iniciativa privada.
Quando se puxa o novelo da
trajetória dessas pessoas, quase sempre se chega ao ente estatal. Mas agora com
novo discurso, reforçado pelos números de programas assistenciais e de
“inclusão social”, que permitiram a milhões de famílias sair da faixa da
miséria ou formar um novo tipo de “classe média”, montada não sobre poupança
real, mas graças a um endividamento perigoso, precário, uma faca só lâmina,
como diria o poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto.
Tudo muda para tudo ficar
igual. Ao mesmo tempo em que Eike Batista era despejado do arrolamento nobre
dos homens mais ricos do planeta, a viúva de Sebastião Camargo, Dirce, pulava à
frente do banqueiro Joseph Safra, tornando-se a terceira maior bilionária
brasileira.
Dirce? Mas quem é Dirce, devem
ter perguntado os atentos leitores do noticiário financeiro. De fato, a viúva
do grande empreiteiro, discreta como o marido, deixara os holofotes da
imprensa.
Mas a Camargo Corrêa, que ainda
hoje, passados quase 40 anos da sua instalação na área, continua a trabalhar (e
faturar) no canteiro de obras de Tucuruí, no rio Tocantins, certamente um
recorde – ao menos nacional.
E funciona a todo vapor nas
novas hidrelétricas de Juruá, no rio Madeira, e de Belo Monte, no Xingu, esta
destinada a ocupar o lugar de Tucuruí no ranking das maiores usinas do mundo.
No ano passado essas duas
frentes de serviços responderam por 30% dos 17,3 bilhões de faturamento da
empresa. Continuará assim pelos próximos anos, um maná tão parecido, na
administração petista do Brasil, àquele que os governos militares
providenciaram para sua empreiteira favorita. A ditadura virou democracia, mas
o dinheiro é o mesmo, embora avolumado na drenagem para mais bolsos privilegiados.
A multiplicação dos bilionários
bem que podia ser considerada uma das maiores obras do PAC, o Programa de
Aceleração do Crescimento (de quem mesmo?).
Fonte: Br.Notícias
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