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segunda-feira, 9 de abril de 2012

SP: 40% das aulas na rede pública serão digitais

Estado de SP vai investir R$ 5,5 bi em dez anos para empresa instalar equipamentos, treinar docentes e criar conteúdos
Presidente do sindicato dos professores diz ver com preocupação 'invasão' de empresa no conteúdo das aulas.
O governo de São Paulo decidiu que uma empresa será a responsável por instalar equipamentos de tecnologia nas escolas, treinar professores para as atividades e até desenvolver conteúdos digitais para as aulas.

Segundo as regras anunciadas ontem pela gestão Geraldo Alckmin (PSDB), 40% das aulas passarão a ser dadas com esses conteúdos.
Haverá, por exemplo, vídeos de cinco minutos para a explicação de conceitos e jogos para fixação de conteúdo.
O projeto abrange todas as disciplinas dos colégios estaduais de 5º ao 9º ano dos ensinos fundamental e médio.
O investimento previsto pelo governo é de R$ 5,5 bilhões, em dez anos. O valor é cinco vezes maior do que o reservado para este ano para reformas nas escolas.
A empresa ainda será escolhida. Segundo a Secretaria da Educação, o governo vai analisar critérios técnicos.
A pasta prevê que em 2013 comece a instalação de lousas digitais (sensíveis ao toque e conectadas à internet). Depois, serão distribuídos "dispositivos móveis" (como notebooks ou tablets).
Com a utilização de conteúdos digitais, hoje escassos na rede, o governo visa melhorar seu ensino - que apresentou pouca melhora no ensino fundamental e recuo no ensino médio, segundo o Idesp (avaliação do Estado). Os conteúdos deverão seguir o currículo da rede, disse a Secretaria da Educação.
Pesquisas nacionais e internacionais que abordaram o uso de tecnologia na educação não detectaram melhora no rendimento dos alunos.
Uma das hipóteses é a de que o conteúdo e a formação dos professores eram inadequados - por isso, o aluno se distraía com a tecnologia.
De acordo com o governo, o projeto vai melhorar o interesse dos alunos e a qualidade das aulas.
A decisão ocorre em meio a uma crise. Nos últimos meses, o governo chegou a chamar até docentes reprovados no teste de admissão.
Presidente da Apeoesp (sindicato docente), Maria Izabel Noronha diz ser favorável à incorporação da tecnologia nas escolas.
Porém, ela critica o fato de uma empresa ser responsáveis pelos conteúdos. "É uma invasão", disse.
A presidente do sindicato também crítica a política do governo. "Não tem recursos para nossa valorização, mas tem para essa parceria privada? Parece até que querem cobrir a falta de professores com esses conteúdos."
A Secretaria da Educação diz que terá de aprovar os conteúdos e que já há política de valorização aos docentes.

Para educadores, tecnologia deve ser usada com cautela

Pesquisador diz que o primordial é investir na formação dos professores

Professora da Unicamp afirma que ideia é 'privatista' porque as empresas cuidariam do conteúdo digital na sala. 
Pesquisadores consultados pela reportagem afirmaram ser favoráveis à introdução de tecnologia nas escolas estaduais. Disseram, porém, que o projeto do governo tem problemas.
"Muita gente diz que a escola mantém práticas defasadas. O projeto pode ser interessante, até porque os índices de qualidade estão ruins", disse a professora do curso de pedagogia Angela Soligo, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Por outro lado, ela vê como problema o fato de empresas criarem conteúdos para as aulas. Ele disse que há o risco de a iniciativa privada passar suas ideias e conceitos aos estudantes. "Mesmo que sutil, é privatização de uma obrigação do Estado."
Ela criticou também a fixação de um percentual destinado aos conteúdos digitais. "O professor deve ter liberdade. As turmas são diferentes."
Ex-representante da Unesco (braço de educação da ONU) no Brasil, Jorge Werthein, disse que "os alunos estão familiarizados com as tecnologias, o que pode aumentar o interesse nas aulas".
Ele destaca, porém, "que todas as pesquisas mostram que há dificuldade em converter essa política em qualidade de ensino".

CAPACITAÇÃO

Para ele, a experiência de países com bons desempenhos mostra que o primordial é investir na formação dos professores.
"Não é rejeitar as tecnologias. Deveria haver uma interação melhor entre o que as redes de ensino querem e o que as faculdades oferecem aos seus estudantes", afirma.
Em reposta às críticas, a Secretaria de Estado da Educação afirmou que os conteúdos digitais seguirão seu currículo e que deverão ser aprovados pela própria pasta.
Disse ainda que os professores não perdem autonomia com o projeto e que um dos seus pilares é justamente a formação de docentes.

PROPOSTA

A ideia do projeto apresentado pelo governo, chamado Aula Interativa, foi proposta pela Dell Computadores.
A companhia fez uma manifestação de interesse da iniciativa privada, mecanismo previsto na legislação das PPPs (Parcerias Público-Privadas).
Nesse dispositivo, cabe ao poder público avaliar a pertinência da proposta - que, neste caso, foi aprovada.
Agora, caberá ao Estado definir qual empresa efetivamente implementará o projeto.

Educação [Painel do Leitor, Folha de São Paulo, 06/04]
A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo lamenta não ter sido questionada pela Folha sobre as críticas à eficiência pedagógica do projeto Aula Interativa, destacadas na Primeira Página ontem. Além de não ter "ouvido o outro lado" sobre esse tópico, o jornal distorceu, em chamada de capa, declarações de especialistas registradas por sua própria reportagem "Para educadores, tecnologia deve ser usada com cautela" ("Cotidiano", ontem), e que não autorizam afirmar que "Estudos dizem que o uso da tecnologia não melhora o desempenho".
Na verdade, o projeto foi concebido à luz de estudos que apontam a ineficácia do simples uso de hardware no ensino.
Por isso nossa estratégia é centrada no professor, com formação continuada e desenvolvimento de conteúdos.
O jornal também se omitiu de nos ouvir sobre a afirmação descabida de que essa iniciativa seria uma "privatização". Não há como privatizar uma atividade que o poder público nem sequer exerce, mas que será normatizada, contratada e controlada de forma transparente, já antes da licitação, a partir de chamada pública para estudos de modelagem de propostas.

Maurício Tuffani, assessor de comunicação da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (São Paulo, SP)

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