Muitos
lutam e trabalham para promover bem estar, qualidade de vida, melhor viver e
sustentabilidade ambiental para todos. A igualdade é o sentido da direção para
as transformações requeridas, cujo significado se materializa na justa
distribuição da renda e da riqueza gerada pelo trabalho de todos. Há muito para
ser feito e é muito bom que a sociedade manifeste o desejo de mudança. Aliás,
não há avanço no sentido da igualdade sem luta social, sem uma sociedade civil
determinada a cobrar de suas instituições a promoção concreta do significado da
justa distribuição da renda e da riqueza.
As
transformações históricas são construídas no presente contínuo do aqui e agora
que se sucede, especialmente porque na luta já se deve anunciar e promover o
conteúdo e a forma do novo que se quer promover. Esse novo conteúdo se
expressa, por exemplo, nas práticas que investem para reunir forças sociais
para mudar; no modo democrático como ocorrem os debates e os convencimentos
expressos em acordos, deliberações ou escolhas pelo voto; na qualidade das
ideias e do imaginário que antecipa o futuro querido e que faz da utopia uma
força que nos mobiliza para construir a transformação.
A
sociedade, no Brasil, mais uma vez acordou para as mazelas do país e passou a
manifestar o desejo de mudança. Ótimo! Faz um ano que, para manifestar o
significado do que se quer como qualidade do serviço e dos bens públicos,
cunhou-se o bordão “eu quero padrão Fifa!”.
Considero
que referenciar no padrão Fifa o imaginário da utopia da qualidade dos bens e
serviços públicos que se busca no presente é subverter o sentido da
transformação e dar-lhe um significado oposto. Trata-se de um atraso e de um
equívoco! Padrão Fifa significa uma institucionalidade marcada pelos meandros
do poder dos grandes interesses financeiros e corporações, de conexões e ganhos
ilícitos, de corrupção do privado e do público, algumas das mazelas já
largamente denunciadas.
Padrão
Fifa significa a ingerência sobre a soberania de Estados e Nações, com regras
que violam a cultura, preceitos, regras, valores de diferentes sociedades. O
interesse econômico subverte um encontro encantador entre nações por meio da
prática de um esporte mágico que é o futebol, subvertendo a soberana
oportunidade de um povo mostrar aos outros o seu jeito de ser feliz e de lutar,
mesmo com suas contradições e mazelas. Padrão Fifa significa transformar esse
espaço de encontro, os estádios, em um espaço segregador e elitizado. Uma
estética contrária ao encontro, cadeirinhas “bem comportadas”, destroem a nossa
cultura de curtir a mágica do futebol em pé, na galera! Arena, esse infeliz
nome, recupera a ideia da guerra, do sangue que corre pelas garras dos leões,
da diversão oriunda do sofrimento e humilhação do outro.
Padrão
Fifa significa excluir, pelos preços exorbitantes dos ingressos das “arenas”, a
galera que sempre lotou os estádios. A alegria de ir ao estádio foi
transformada em um negócio que exclui a maioria, mais uma vez colocados para
fora de um espaço que era seu! Padrão Fifa significa exclusão.
Padrão
Fifa significa colocar para fora dos estádios, e no seu entorno, todos aqueles
que faziam do picolé, da pipoca, da água, do amendoim, da bandeira, o seu
trabalho à serviço do lazer e da confraternização, do sofrimento e da alegria.
Padrão
Fifa significa concordar com a mercantilização do futebol como máquina de fazer
dinheiro – ou de lavá-lo – na qual elenco, comissão técnica e os times viram
máquinas do marketing de consumo a serviço da desigualdade. É recorrente o
salário de todos os jogadores de um time ser menor que o salário de um dos
jogadores do time adversário. O ganho mensal de um craque é maior que o salário
de toda uma vida de um trabalhador. Padrão Fifa é desigualdade sem fim!
Padrão
Fifa significa construir uma estética nos estádios desconectadas da cultura e
das condições econômicas da nossa sociedade, um padrão que não permite o acesso
à todos, que não é passível de universalização, que não nos leva ao encontro do
outro. Padrão Fifa elimina o valor das nossas diferenças para promover a iniquidade
da desigualdade.
Seríamos
mais felizes com o futebol sem o padrão Fifa!
Não
quero esse padrão nem para escola, nem para a saúde, nem para o transporte
coletivo, nem para nada! Quero um padrão que seja a nossa cara, que nos permita
ter qualidade para todos, sem ser suntuoso e, muito menos, segregador. Quero um
padrão que traga o sentido da igualdade e da qualidade como um valor manifesto
substantivamente nos bens e serviços públicos.
Quero
um padrão de bem público que nos leve ao encontro, que favoreça nosso
relacionamento e que nos permita sermos diferentes – não desiguais – e, com os
outros, felizes. Quero um padrão que nos faça criativos para superar nossas
iniquidades. Quero um padrão que faça de cada criatura um criador, pelo que é,
pelo que pode oferecer ao outro e ao país. Quero a descoberta, renovada a cada
dia, de que a alegria é o contentamento compartilhado com o outro e que cada
espaço deve ser construído com essa intencionalidade.
No
padrão Fifa o outro não existe e sem ele não há alegria! Não quero o padrão
Fifa! Usar esse bordão é destruir a minha (ou a nossa!) utopia!
Vou
me divertir com a Copa. Vou torcer pelo Brasil, vou torcer pelo bom futebol,
vou curtir o espetáculo e o encanto desse campeonato. Vou esquecer e ignorar a
Fifa. Depois, vou continuar lutando para avançar no legado da Copa!
Fonte
- Ibase, acessado em 25 de junho, 2014.
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