O destroier Truxtum com misseis
teleguiados dos EUA cruza os estreitos de Dardanelos e Bósforo em direção ao
Mar Negro. Nas suas bases aéreas na antiga “cortina de ferro” o gendarme da paz
imperialista intensifica os exercícios de guerra. A temperatura aumenta e o
cenário de guerra sobe um pouco mais. Mas esta é apenas a superfície
espetacular do processo geopolítico. Há coisas muito mais importantes que as
imagens a serem consideradas.
O espetáculo imperialista não
pode parar. Mesmo com os Estados Unidos correndo o risco de ascender o pavio de
uma guerra real. Vejamos as coisas deste ponto de vista, além do espetáculo
encenado nas mídias e redes imperialistas globais. O espetáculo da guerra está
montado na Criméia. A passagem, em 7 de Março, por exemplo, de navios de guerra
dos EUA pelos estreitos de Dardanelos e Bósforo, que ligam o Mediterrâneo ao
Mar Negro foi mais uma clara provocação. Ao movimentar sua gigantesca máquina
naval para o Mar Negro os EUA dão um claro sinal que desejam uma capitulação
diplomática da Rússia na crise da Ucrânia. Depois da derrota na negociação das
armas químicas na Síria, agora precisam mais do que nunca reafirmar quem é quem
nos mares do mundo.
Qual será a resposta de Moscou
frente a essa mexida de piões de Washington? Este último apenas insinua do que
está disposto. Mostrando o revolver. A bola está com Sergei Lavrov, secretário
russo das relações exteriores e brilhante estrategista diplomático. Não pode
piscar. Para começar, pode denunciar o rompimento da Convenção de Montreux, de
1936, que disciplina o regime dos estreitos. No caso de Dardanelos e Bósforo, é
vedado o trânsito de embarcações de guerra com bandeiras outras que dos países
que fazem fronteira com o Mar Negro. Prevendo ação penal de contravenção do
direito internacional os EUA já anteciparam que seus navios farão “manobras
conjuntas” com as marinhas da Bulgária e Romênia. Bem próximas de Sebastopol,
de preferência. É assim que se faz preparativos da guerra. De intimidação, inicialmente.
O SENTIDO DA GUERRA – Não é só
pelos mares que os EUA procuram cercar a Rússia. Também pelos ares. Se no Mar
Negro os EUA trabalham com seus valetes romenos, búlgaros, húngaros, etc.,
também em ininterruptos exercícios militares aéreos, no Báltico trabalham com
os poloneses. Dia 13 de Março, os EUA reforçaram sua base aérea de Lask, na
Polônia, com mais dezenas de caças F-16. Neste final de semana, segundo a
embaixada estadunidense, aterrissarão mais doze aparelhos. Há varias semanas
multiplicam-se os exercícios de guerra em vários países do leste europeu. Sob a
bandeira da OTAN, os EUA também estão a enviar aeronaves de alerta aéreo
antecipado (AWACS) para voos de reconhecimento sobre a Polônia a e Romênia e
“monitorar a crise na Ucrânia”, disse porta-voz da OTAN no dia 10 de Março.
“Essas rotas estão bem estabelecidas e serão executadas a partir das suas bases
aéreas regulares de Geilenkirchen, na Alemanha, e Waddington, no Reino Unido”,
completou.
Toda a antiga “cortina de
ferro” do Pacto de Varsóvia (1945-1990) agora está coalhada de bases militares
estadunidenses. A próxima pode ser em Kiev. Esse alargamento militar dos EUA na
Europa é necessário para proteger as burguesias europeias decadentes do
esfacelamento na próxima crise econômica global. Esse esfacelamento já mostrou
alguns sinais no último período de crise do euro, etc. O próximo choque
econômico, muitas vezes mais potente que o anterior, levará a uma aguda
fragilização política dos seus principais Estados nacionais – Alemanha, França,
Inglaterra, Itália... Neste cenário, o que se vislumbra no horizonte dos
próximos dez anos são prováveis guerras civis e esfacelamento geopolítico em
toda União Europeia. E na esteira dessas rupturas, o fantasma da revolução
social.
VELHOS ALIADOS – São essas
perspectivas estratégicas que guiam as ações militares norte-americanas na
Europa e, em particular, na questão ucraniana. A própria Rússia entra neste
pacote de alargamento geográfico do gendarme imperialista global por toda a
Europa. Como aliada estratégica dos EUA na contrarrevolução na Europa. Como
sempre foi, desde os tempos do regime estalinista, pelo menos. Apesar do enorme
e relativamente autônomo poderio militar russo, o que os EUA procuram impor ao
seu aliado de sempre é a mudança da sua concepção estratégica e geopolítica
para a Europa. Não necessariamente para a Ásia e Oriente Médio. Essa é a grande
barganha que EUA e Rússia procurarão costurar nas próximas semanas.
No dia 14 de Março,
sexta-feira, os secretários das relações exteriores John Kerry (EUA) e Sergei
Lavrov (Rússia) se reuniram em Londres. Foi um dos mais longos da história
diplomática. Mais de seis horas ininterruptas. De tempos em tempos abandonavam
a sala de reunião e caminhavam só os dois pelo extenso terreno gramado do campo
de golfe da casa do embaixador norte-americano. Principalmente nestes momentos
de total privacidade eles poderiam estar avançando um pouco mais nesta grande
barganha geopolítica. E nas formas de acomodação da crise ucraniana. Essa
última é a parte mais fácil.
O cenário mais provável para o
desenlace da chamada crise ucraniana não é, portanto, uma guerra aberta das
potências imperialistas com a Rússia, mas uma acomodação estratégica desta
última ao expansionismo estadunidense, nos termos em que Kerry e Lavrov devem
ter discutido na sexta-feira, em Londres. Incluindo as formas honrosas para
ambos os lados na saída da crise ucraniana.
O cenário menos provável de uma
nova Guerra da Criméia não pode ser totalmente descartado. Entretanto, fica por
conta unicamente do destino e das casualidades históricas, que não raras vezes
deram suas caras na longa tragédia humana das guerras e transformações
revolucionárias da ordem internacional. Esta ordem que agora é mais uma vez
solidamente planejada e estabelecida pelos grandes arquitetos da diplomacia da
paz. Pronta para se desmanchar em armas.
Fonte: CRÍTICA SEMANAL DA ECONOMIA
Tel. (11) 92357060 ou (48)
96409331 e-mail: criticasemanal@uol.com.br
EDIÇÃO Nº 1183 – Ano 28; 3ª
semana Março 2014.
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